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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

VISITA AO HABITAT DE BROMÉLIAS DO GÊNERO DYCKIA, NO MATO GROSSO – NOVEMBRO DE 2016

Dyckia rondonopolitana no seu habitat


Durante muitos anos, na Década de 1980, percorri a rodovia MT130, entre Rondonópolis e Poxoréo, no Sul do Mato Grosso, desde que esta representava nada mais que um caminho de terra, em rústicas condições, até vê-la asfaltada, anos depois. Trabalhando em Primavera do Leste, local onde hoje desenvolvemos o projeto de conservação de vegetações de Cerrado, denominado Reserva Natural da Fazenda Ipanema, residia em Rondonópolis, obrigando-me a cruzar aqueles duros caminhos, em tempos de fronteiras agrícolas nascentes. Naquele tempo, embora já investigasse a natureza, não me aproximara ainda das plantas da família Bromeliaceae, que viriam a ocupar importante papel, em minhas investigações científicas naturalistas.

Durante uma dessas viagens, obriguei-me a parar, em meio ao caminho, em função de obras de terraplenagem, que eram realizadas num trecho de serras sinuosas, para mitigar as endêmicas dificuldades representadas por afloramentos de arenito. Já um aficionado por orquídeas, atraí-me por exemplares de Epidendrum campestre, que haviam sido arrancados, juntamente com as pedras da estrada. Junto, coletei uma pequena bromélia espinhenta e de folhas quebradiças, que também haviam se transformado em lixo das obras. Cultivei a curiosa planta, por anos a fio, até vê-la perdida, numa das diversas mudanças de endereço da coleção de plantas.

ilustração de Epidendrum campestre (Orchidaceae) elaborada pelo autor, na década de 1980, a partir de material obtido neste mesmo local

Já devidamente iniciado no gosto pelas bromélias, nos anos 1990, quando geríamos a Sociedade Brasileira de Bromélias-SBBr, que impulsionava o conhecimento desta família botânica, me foi dado identificar o grupo a que pertencia aquela joia botânica – o gênero Dyckia – de imensa importância para a interpretação biogeográfica do nosso país, como bem apontou a Professora Doutora Rafaela Forzza, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Com o passar dos anos, incrementou-se o interesse pelas Dyckia spp. e seus habitats, ao largo dos corredores áridos do passado sul-americano, Brasil, em especial.

Em recente passagem pelo local, hoje modernizado pela concessão rodoviária, numa estrada pedagiada e de alta velocidade, decidi parar e visitar aquele mesmo trecho de arenitos, em busca de informações sobre essas curiosas plantas. Embora muito ligeira, a parada foi frutífera em contatos com essas plantas e ajudou a entender um pouco mais sobre a dispersão das Dyckia spp., ao largo do Planalto dos Alcantilados, unidade de paisagem associada aos pediplanos mato-grossenses, a que dediquei largos capítulos de meu livro FITOGEOGRAFIA DO BRASIL (NAU Editora, 2015 – link: http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/10/o-livro-fitogeografia-do-brasil-uma.html ).
A antiga individualização de unidades de relevo das serras alcantiladas desta região, que perfaz ligação ecológica entre a Planície Pantaneira (a oeste) e Vale do Araguaia (a leste), tendo como corredores importantes o rio Vermelho (e São Lourenço), pelo lado pantaneiro, e o rio Garças, pela vertente araguaiana, parece ter originado concomitante diferenciação nas populações de espécies deste gênero Dyckia, como já havia atestado anteriormente, numa visita a outro habitat dessas bromélias (ver postagem - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/04/encontrando-novas-populacoes-de.html ). Também na RPPN João Basso, em Rondonópolis, havíamos observado diversas espécies deste gênero (ver postagem - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2013/03/rppn-joao-basso-cidade-de-pedra-de.html).Tudo mostra haver ainda muito a ser descoberto, não somente no que diz respeito às bromélias deste gênero, mas também na história natural e fitogeográfica desta região, haja vista a virtual diversidade de táxons observados, ao longo do corredor.
Nos arenitos tórridos da MT130, dominados por cerrados rupestres, vegetam pelo menos duas espécies de bromélias do gênero Dyckia, ambas recentemente descritas pela ciência: Dyckia rondonopolitana e Dyckia secundifolia, esta última exatamente a minha velha planta perdida. Dyckia rondonopolitana é planta que se ramifica bastante e ocupa largos espaços, vegetando em frestas de rochas, entre touceiras de gramíneas e até mesmo de forma litofítica, subsistindo diretamente na superfície nua dos arenitos quentes. Já Dyckia secundifolia se restringe a pequenas bacias deflacionares da rocha, onde se acumula areia fina e outros dispersóides. É comum que se associe a formigas e acompanha certa espécie de Velloziaceae, enraizando ambas de forma inquietantemente superficial, sobre o embasamento rochoso quente e drenado.

Veja, a seguir, alguns aspectos ligeiros desta visita aos arenitos que abrigam as Dyckia spp. de Rondonópolis, no Mato Grosso:

Acima - Dyckia secundifolia junto a Vellozia sp., em seu habitat, no Mato Grosso

Acima - Aspecto geral da ocorrência de Dyckia rondonopolitana, nos arenitos de Rondonópolis


Acima - arenito exposto à erosão diferencial, no Planalto dos Alcantilados, onde está o habitat das Dyckia spp. Essa forma é reconhecida como "casco de tartaruga"

Adiante - imagens do habitat de Dyckia rondonopolitana e D. secundifolia, mostrando sinais de forte regime erosivo, em linhas de vazão torrencial, que são as principais forças escultoras do relevo ruiniforme do Planalto dos Alcantilados





Abaixo - populações de Dyckia rondonopolitana, em suas ocorrências típicas






A Seguir - ocorrência de Dyckia secundifolia, notando-se sua predileção por depósitos delgados de areias finas, em depressões do arenito coeso

 Acima - plantas convivendo com ninhos de formigas






segunda-feira, 7 de novembro de 2016

NOVA EXPEDIÇÃO À CHAPADA DOS VEADEIROS – GOIÁS – OUTUBRO DE 2016


Acima – Cachoeira dos 120m, no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros

Onze anos após minha primeira passagem pela Chapada dos Veadeiros, norte de Goiás, voltava à região, com intuito de conferir alguns importantes aspectos de sua geografia botânica, já em posse de informações e reflexões levadas a público, em meu livro FITOGEOGRAFIA DO BRASIL (ver postagem - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/10/o-livro-fitogeografia-do-brasil-uma.html ), através da NAU Editora (2015). Claro que a beleza de suas paisagens, cheias de cachoeiras e monumentos naturais, ligados ao Cerrado, também justificavam esta digressão de minha viagem ao Mato Grosso, para onde seguiria depois. Mas, não há dúvidas, rever os incríveis cerrados rupestres, numa transição singular para as florestas estacionais semideciduais e deciduais do oeste baiano e Tocantins,  era objetivo principal.

Quando ali estivera, em março de 2015 (ver postagem anterior - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2016/10/chapada-dos-veadeiros-goias-marco-de.html ), meu guia Naza me afirmara ter ouvido que “o Cerrado teria surgido na Chapada dos Veadeiros, antes de se espalhar pelo restante do país”. É claro que as origens do Cerrado são complexas e sua flora não é, de forma alguma, monocêntrica, ou seja, originária de uma região apenas. Em minha citada obra, tive oportunidade de mostrar os conhecimentos que a ciência acumulou sobre o Cerrado, nas últimas décadas, que induzem sua interpretação como um produto relativamente recente de diversas floras circunjacentes, fundidas ao sabor do avanço Terciário dos climas continentais e da ajuda do homem, através do generalização do uso do fogo, no Quaternário.

Mas, uma coisa ficara clara, no capítulo que dediquei a este Bioma (Cerrado), em meu livro: suas formas mais abertas e típicas, que acumulam espécies de árvores e até mesmo arbustos retorcidos, de aspecto xeromórfico, com espessas cascas e folhas duras e perenes, teriam obtido boa parte deste tributo adaptativo de vegetações rupestres, ou seja, que dominavam habitats marcados por rochas e solos rasos. Campos rupestres, florestas estacionais deciduais e cerrados rupestres teriam, deste modo, uma forte relação original. O império do clima subúmido do Brasil Central, associado ao fogo endêmico, teria promovido prolongada manutenção de vegetações de natureza aberta e iluminada, mesmo em face de solos profundos, como são aqueles do Cerrado. Neste entremeio, neste compartimento fortemente iluminado e relativamente protegido da competição de suas árvores mais portentosas, teria prosperado a flora típica do assim chamado cerrado stricto sensu, ou simplesmente o cerrado propriamente dito – isso é parte da Teoria de Rizzini-Lund-Aubrèville.

Talvez tenha advindo daí a suposição referida por Naza de que o Cerrado teria surgido na Chapada dos Veadeiros: ali se encontra um dos mais bem conservados conjuntos de vegetações de cerrados rupestres, campos rupestres e, principalmente, cerrados rupestres de altitude do Brasil, o que suscita possíveis conclusões sobre estar ali a pátria fundamental do Cerrado. Com altitudes de até mais de 1.600m, as áreas do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, centralizadas pela cidade de Alto Paraíso de Goiás, representam importante testemunho paisagístico da longa exumação do Arco Brasiliano, ligado ao Arco da Canastra, uma antiquíssima sutura geológica, relacionada a colisões de placas tectônicas Proterozóicas. Com o soerguimento do Brasil Oriental, nos últimos noventa milhões de anos, pelo menos, a erosão milenar vem expondo essas velhas rochas de quartzito, o que seguramente abriu espaço ecológico ao desenvolvimento de flora típica de campos rupestres. Daí a supor que a Chapada dos Veadeiros seja a origem do Cerrado pode ser evidente exagero, mas não se poderá duvidar de seu papel histórico natural determinante, como refúgio de floras típicas.

Nesta visita, mais uma vez, contei com a proveitosa presença do amigo e companheiro de expedições Maurício Verboonen, que tradicionalmente aduz essas experiências com reflexões importantes. Vamos às imagens e comentários sobre mais esta aventura pela deslumbrante natureza brasileira:

A Seguir – Contemplando-se as paisagens da Chapada dos Veadeiros, temos oportunidade de vislumbrar alguns dos mais autênticos cerrados rupestres do país, em vastas extensões. Árvores e arbustos típicos vegetam sobre campos de blocos e fragmentos de rocha quartzítica, aos quais se entremeiam cascalhos de cristal, remanescentes de minerações do passado






Acima – próximo a Alto Paraíso de Goiás, no sopé do planalto, surgem vestígios da floresta estacional semidecidual, que dali se estendem, longamente, até a base do planalto do oeste da Bahia. Nesta imagem, observam-se populações características de babaçus (Attalea speciosa)


Acima - Wunderlichia crulsiana (Asteraceae) - planta endêmica dos cerrados rupestres desta região



Acima – Estradinha rural da Chapada dos Veadeiros, onde as condições de tráfego são usualmente duras, como mostra o vídeo mostrado a seguir



Acima – Aspecto geral de um cerrado rupestre, na franja do planalto da Chapada dos Veadeiros

Adiante – O Jardim de Maytrea é uma das mais famosas atrações cênicas do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, consistindo nos vestígios de um paleocanal fluvial, que ainda conserva seu típico renque de palmeiras-buritis (Mauritia flexuosa)




Acima – mosaico de cerrado rupestre, onde se percebe a dispersão bastante diversificada de elementos herbáceo-arbustivos, tais como canelas-de-ema ou candombás (Vellozia variabilis - Velloziaceae), que dominam clareiras formadas de puro detrito quartzítico. O pau-terrinha (Qualea parviflora – Vochysiaceae), visto na foto, com delicadas flores violeta, é uma arvoreta muito comum, na borda dessas clareiras

A Seguir – O muricizão (Byrsonima verbascifolia – Malpighiaceae) é uma das arvoretas características dos cerrados rupestres, que se diria originário da Chapada dos Veadeiros, de tão perfeita sua adaptação à região



 Abaixo – Outra arvoreta sugestiva da ligação do cerrado stricto-sensu com vegetações rupestres é o bate-caixa (Palicourea rigida - Rubiaceae)



Acima – Paineira-do-cerrado (Erioteca pubescens – Malvaceae) pode variar de uma arvoreta baixa, no cerrado rupestre, até uma árvore relativamente frondosa, nas formações mais densas

A Seguir – Nessa expedição, havia interesse em algumas espécies particulares, que habitam ambientes específicos do cerrado rupestre ou dos campos rupestres. Entre elas, destaca-se a minúscula bromélia Dyckia marnier-lapostollei, cujo habitat preferencial, no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, alterna depósitos de cascalhos naturais e pedras britadas pelos mineradores, que vasculharam a região, outrora, em busca de cristais



Acima e adiante – Detalhes da bromélia Dyckia marnier-lapostollei, em seu ambiente natural





Adiante – As fisionomias abertas da Chapada dos Veadeiros são determinadas essencialmente pelas manchas edáficas, ou seja, pela natureza dos solos de cada ambiente. Algumas espécies de fabáceas (leguminosas) tiram partido dessas janelas de luz, assim como dos solos presentes em cada um desses locais. O gênero Mimosa é particularmente abundante: Mimosa densa é uma planta que forma populações quase homogêneas, em determinados trechos


A SeguirMimosa ulei era outra dessas fabáceas que representavam atrativo principal, para a expedição: suas populações são características de pequenas manchas de solos de quartzito saturadas de umidade, formando como que mini-bosques de arvoretas em miniatura, bastante esculturais



Acima – flor de Mimosa ulei (detalhe)



Acima – longas inflorescências de Mimosa ulei, que lhe conferem aspecto singular, na paisagem


Acima – Algumas dessas Mimosa spp. exibem hábito escultural, posando de miniaturas de árvores, qual bonsais

A SeguirMimosa regina pontua os campos sujos (campos sobre rochas) da Chapada dos Veadeiros, na localidade de Cavalcanti


Acima – detalhe das flores de Mimosa regina

Adiante – Como não poderia deixar de ser, outras bromélias atraíam nosso interesse, na Chapada dos Veadeiros:

Acima – Aechmea bromeliifolia, entre os afloramentos de rocha quartzítica

Acima – Orlando Graeff examina exemplar de Aechmea bromeliifolia variedade albobracteata, num scrub lenhoso denso, em Alto Paraíso de Goiás

Acima – Ananas bracteatus, na margem da floresta estacional, próximo ao rio Tocantinzinho, em Colinas do Sul

A Seguir – Bromelia cf. balansae é outra bromeliácea abundante, nas áreas mais secas da Chapada dos Veadeiros


Acima – O autor posa ao lado de um exemplar de Bromelia cf. balansae, que iniciava seu florescimento, na Chapada dos Veadeiros

Acima – Bromelia cf. balansae

A Seguir – Sobre a cimeira da Chapada, surgem vegetações excepcionais, nos canais dos rios, onde surgem florestas densas e abundantes em plantas epifíticas



Acima – Florestas ciliares da Chapada dos Veadeiros, em detalhe

Acima – orquídea Gomesa varicosa (=Coppensia varicosa), no terço inferior de um tronco, no interior da floresta ciliar, na Chapada dos Veadeiros

Acima – nos altos galhos da mesma floresta, habitam outras espécies de orquídeas que preferem mais iluminação, como esta espécie de Bulbophyllum



Acima – a bromélia Tillandsia streptocarpa produz flores perfumadas

Acima – graciosa palmeira Geonoma cf. maxima, no solos úmido e ambiente sombreado da floresta ciliar, na faixa dos 1.600m de altitude

Adiante – Nos campos rupestres de altitude, na Chapada dos Veadeiros, medram plantas atraentes e singulares

Acima – Jacaranda ulei (Bignoniaceae)

Acima – Campomanesia sp. (Myrtaceae)

Acima – a minúscula Polygala equisetoides (Polygalaceae)

Acima – Eryngium pristis (Apiaceae)

 Acima – Kielmeyera rubriflora (Clusiaceae)

Acima – Vochysia pumila (Vochysiaceae)

Acima Lavoisiera sp. (Melastomataceae)

Acima – Pilosocereus machrisii (Cactaceae)

AbaixoMaurício Verboonen na trilha do Moinho, na Chapada dos Veadeiros


A Seguir – A alta bacia do rio Tocantins possui alguns de seus tributários na Chapada dos Veadeiros, entre eles, o rio Tocantinzinho, que congrega extensas florestas em suas margens, o que corresponde a corredor ecológico de suprema importância






Acima – floresta marginal do rio Tocantinzinho, próximo a Colinas do Sul, onde se abrigam orquídeas como Cattleya cf. walkeriana (abaixo)


 

Acima – Vochysia cf. acuminata, na floresta ciliar do rio Tocantinzinho


Adiante – o rio Preto é o principal corpo d’água do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros e reúne alguns de seus mais deslumbrantes cenários, como cachoeiras e cânions




Acima – pau-óleo (Copaifera langsdorfii – Fabaceae) se debruçando sobre o leito do rio Preto

Acima – Cachoeira dos 80m, no rio Preto

Acima – cascatas límpidas, em Cavalcanti, na Chapada dos Veadeiros

Acima – a belíssima cachoeira de Santa Bárbara, em Cavalcanti, na Chapada dos Veadeiros

Acima – a curiosa asterácea Chresta angustifolia, que habita as rochas, nas cachoeiras da Chapada dos Veadeiros

Abaixo – Entardecer na Chapada dos Veadeiros, em Goiás