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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

sábado, 11 de novembro de 2017

VISITA AO MÉDIO VALE DO RIO DAS MORTES – MATO GROSSO – OUTUBRO DE 2017


Acima – Cachoeira da Fumaça, no médio rio das Mortes


Ainda contando com a indispensável companhia de meu amigo Sérgio Basso, insubstituível guia pelas paisagens do Sudeste do Mato Grosso, pude conhecer o médio vale do rio das Mortes, a norte da rodovia BR070, entre os municípios de Primavera do Leste, General Carneiro e Novo São Joaquim.

O rio das Mortes, que atravessa a Reserva Natural da Fazenda Ipanema (veja postagens - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2017/03/investigando-floresta-galeria-da.html ), nasce na Serra de São Vicente, a oeste, atravessando extensa superfície de chapadas planálticas, na região visitada, e infletindo progressivamente a nordeste, para se juntar ao Araguaia, na Ilha do Bananal.

Embora drenando bacia diversa daquelas que escavaram o célebre Planalto dos Alcantilados, ao sul (alto rio das Garças – correndo ao Araguaia; e rio Vermelho – correndo ao Pantanal), esse setor do rio das Mortes congrega paisagens ainda similares às daquele, com imensos morros-testemunha, à forma de mesas ou tepuis, alternando-se com planalto colinoso, cujas cimeiras são os famosos chapadões planos, hoje cobertos por lavouras de grãos.

 Nossos principais interesses, nesta expedição: examinar diversos morros-testemunho, com sua flora residual; e conhecer as admiráveis cachoeiras do rio das Mortes, ao redor das quais se concentram afloramentos rochosos, com flora característica rupícola e saxícola.

Veja, adiante, alguns aspectos fitogeográficos e botânicos relevantes, que acompanham as imagens desta expedição:


A seguir – No caminho para a depressão do vale do rio das Mortes, a pecuária já transformou bastante a paisagem botânica, embora alguns elementos ainda sobressaiam, como a bromeliácea Bromelia balansae, espécie bastante característica da região






Adiante – Pequenos morros-testemunho são marcos típicos da paisagem arrasada do vale do rio das Mortes. Um dos objetivos da viagem era investigar-lhes a vegetação e a ecologia







Acima – A esperança de encontrar flora endêmica de afloramentos, com elementos como bromélias, orquídeas, aráceas e cactáceas se esvaiu, quando galgamos alguns desses morrotes, que não passavam de refúgios de cerrados rupestres, formados sobre solos clásticos, compostos de miríades de pedras trituradas pela erosão das rochas restantes de seus cimos quase estéreis
Abaixo – Esses morrotes isolados, em meio a vastas áreas de cerrados, nada mais representam que testemunhas de suas antigas superfícies de cimeira, sobre as quais, em passado de Terciário a Quaternário inicial, dominavam vegetações arbóreas relacionadas ao Cerrado. A flora herbácea que procurávamos, se um dia existiu, foi lentamente extinta, em função de processos biogeográficos característicos de ilhas (Biogeografia de Ilhas)




Adiante – O apogeu da expedição se deu mesmo na margem do rio das Mortes, próximo aos saltos da Cachoeira da Fumaça, pertencente ao município de Novo São Joaquim, onde encontramos ecossistemas de imenso interesse botânico – afloramentos rochosos ribeirinhos. Entre grandes lajeiros de arenito expostos ao sol inclemente, vegeta flora notável por seus elementos herbáceos saxícolas: bromeliáceas, cactáceas, velosiáceas principalmente.

Veja o vídeo que mostra um dos principais saltos do rio das Mortes:


Tudo isso abrigado entre arvoretas e arbustos adaptados, alguns deles provavelmente endêmicos da região





Acima – Uma espécie de bromélia, que acreditamos se tratar de Bromelia sylvicola, representava elemento notável, ocupando nicho bastante específico e produzindo inflorescência bastante singulares.



Acima – Algumas das flores de Bromelia cf. sylvicola apresentavam tonalidade quase alva, emergindo entre brácteas escapais recobertas de lanugem também esbranquiçada. As plantas, de modo geral, diferem bastante de Bromelia balansae, espécie dominante nos cerrados do sul do Mato Grosso

Adiante – Ilhas de vegetação arborescente formam como que abrigos naturais à flora saxícola do rio das Mortes. São cajuzinhos (Anacardium humile – Anacardiaceae), cambarás (Vochysia spp. – Vochysiaceae), pequizeiros (Caryocar brasiliense – Caryocaraceae), muricis (Byrsonima affinis – Malpighiaceae) e rabos-de-arara (Norantea guianensis – Marcgraviaceae), além de inúmeras mirtáceas e fabáceas adaptadas ao ambiente extremo





Acima – A vegetação típica se debruça sobre o canal muito encaixado do rio das Mortes, neste trecho rochoso dos saltos

A seguir – Um dos mais marcantes achados foram numerosas populações de outra espécie de bromeliácea, que se espalham por sobre os afloramentos de arenito, chegando a formar largas touceiras. Pertenciam ao grupo de plantas que temos buscado investigar, ao longo do Mato Grosso – Dyckia spp. – que representa importante indicador de migrações e adaptações botânicas ocorridas nos últimos milhões de anos, nesta parte do Brasil, provavelmente acompanhando antigos corredores áridos e frios





Acima – Essas micropaisagens de Dyckia sp. e Bromelia cf. sylvicola são também marcadas por Vellozia sp., Barbacenia sp. (Velloziaceae) e decorativas cactáceas epifíticas (Hylocereus setaceus), que emprestam ao local uma fisionomia extremamente ornamental - Abaixo


Acima – Orlando Graeff junto a uma notável população de Vellozia sp.



Acima – Fruto pedunculado do cajuí, ou cajuzinho-do-cerrado (Anacardium humile – Anacardiaceae), arvoreta que se mostra muito expressiva na flora dos afloramentos do rio das Mortes, em Novo São Joaquim


Acima – Embora não formasse populações tão notáveis, quanto as demais bromeliáceas, Ananas ananassoides estava presente na vegetação saxícola, como a lembrar a hegemonia indissociável do Cerrado, do qual é planta indicadora

A seguir – O ambiente mais próximo ao canal do rio das Mortes é notadamente mais úmido e abriga flora um tanto mais diversa daquela encontrada nos afloramentos de arenito acima: arvoretas mais diversificadas, palmeiras justafluviais e diversas aráceas se exibiam à vista, em meio ao frescor do spray das cascatas



Acima – Anthurium sp. (Araceae), com decorativas folhas e “ninhos” de raízes captoras de detritos


Acima – Urospatha sagittifolia (Araceae) se adapta bem ao ambiente semiaquático junto ao caudal do rio das Mortes


Acima – As lindas flores de Jacaranda cuspidifolia (Bignoniaceae)

Acima – Curioso registro de plantas aquáticas dessecadas durante o período de baixa do rio das Mortes

Acima – Sérgio Basso mostra a beleza dos saltos do rio das Mortes


sexta-feira, 3 de novembro de 2017

REVISITANDO O HABITAT DE UMA BROMÉLIA DO GÊNERO DYCKIA, EM MATO GROSSO – OUTUBRO 2017




Depois de muitos anos, desde a primeira visita ao habitat de uma interessante espécie de bromélia do gênero Dyckia, no Sul do estado de Mato Grosso (ver postagem http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/04/encontrando-novas-populacoes-de.html  ), algumas outras indagações haviam surgido, além, é claro, da própria identidade da minúscula e elegante plantinha, que prossegue sem elucidação: que tipo de habitat abrigaria preferencialmente essas espécies-relíquia da flora americana? Por que surgiriam populações segregadas de algumas delas? E por que surgiriam esses endemismos restritos, em meio ao oceano de cerrados, que se estende nessa região do Centro-Oeste?

Nada mais alvissareiro que ter ao meu lado, nesta excursão (que faria parte de uma expedição maior – ver postagens subsequentes, em elaboração), o grande amigo, companheiro de velhas incursões pela região -  Sérgio Basso - que fora, aliás, quem me conduzira ao local, na primeira visita, em 2001). Partimos de Primavera do Leste, onde está centralizado o projeto da Reserva Natural da Fazenda Ipanema, nosso endereço naturalista no Mato Grosso, tendo como objetivo o habitat da minúscula Dyckia sp., em meio aos domínios do chamado Planalto dos Alcantilados, ao longo da rodovia BR070.

O Planalto dos Alcantilados é uma subdivisão geomorfológica, que congrega velhos morros testemunho, deixados para trás pela ciclópica erosão diferencial, que individualizou uma série de mesetas ou tepuis, que são aqueles morrotes de cimeira plana, que se espalham pelo Brasil Central. Ecologicamente, liga duas gigantescas depressões de origem entre o final do Terciário e início do Quaternário: Pantanal Matogrossense e Planície do Araguaia. Nossa investigação não se limitaria ao platô das Dyckias, mas se estenderia a outros morrotes isolados, situados na região, embora já conhecêssemos alguns deles.

Para nosso alívio, a restrita população de Dyckia sp. lá estava, na mesma situação praticamente em que a encontramos, cerca de dezesseis anos atrás: grande quantidade dessas pequenas bromélias esculturais e espinhentas a se espalhar nas bordas de microafloramentos de arenito muito friável; em meio a cascalhos e clastos recém-desprendidos; ou em microdepressões recobertas de areia; dividindo espaço com velosiáceas, orquidáceas, melastomatáceas e farta quantidade de gramíneas, entre nativas e invasoras. Muitas delas haviam florescido recentemente e ainda sustentavam cápsulas repletas de sementes.

Essas plantinhas são realmente muito resistentes, em seu habitat, vegetando agarradas diretamente à rocha sã, ou, quando muito, metendo suas raízes sob pedregulhos calcinados, onde parecem conseguir um pouco de umidade a mais. De todo modo, cozinham sob o sol escaldante do Mato Grosso, resistindo sobre essas velhas cimeiras de rocha avermelhada. Quase inexistem elementos arbóreos no local, o que chama atenção, por diferir de algumas outras Dyckia spp. da região, tal como se observa no habitat de Dyckia rondonopolitana e D. secundifolia (ver postagem - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2016/11/visita-ao-habitat-de-bromelias-do.html).

Lá estavam aquelas pequenas plantas ruborizadas, muito decorativas, entremeadas aos demais indivíduos de coloração típica esverdeada, sugerindo estratégia de resistência. O habitat desta Dyckia sp. ocupa claramente um tipo específico de afloramento rochoso de arenito, em que inexistem blocos diaclasados (boulders ou matacões). Embora perigosamente restrito, em face de sua superfície total nada extensa, o afloramento conta com alguns hectares, havendo outros similares, nas cercanias, que não nos foi dado examinar, infelizmente.

Estivemos a examinar outros morros-testemunho, no entorno de até uns cinquenta quilômetros, sem que pudéssemos encontrar quaisquer outras populações dessa plantinha, ou sequer das orquídeas e outras plantas rupícolas ou saxícolas que lhe acompanhavam nesse afloramento. Parece que, a depender da natureza do arenito envolvido no surgimento desses afloramentos, tanto quanto dos processos erosivos que lhes exumaram do coração do solo, esses afloramentos realmente funcionam como ilhas e, como tal, sujeitam-se aos processos biogeográficos que regem sua ecologia.


A região do Planalto dos Alcantilados, assim como algumas de suas circunvizinhas, é abundante em bromélias do gênero Dyckia. Porém, nunca conseguimos encontrar outra população dessa linda plantinha, cuja identidade espero ainda vir conhecer.

Acima - aspecto geral do habitat de Dyckia sp., em Mato Grosso, com inúmeros clastos que descamam da rocha de arenito e as minúsculas bromélias, em meio à macega

Acima - arvoretas surgem apenas em depósitos de solos, em meio a frestas na rocha

Acima - as pequenas bromélias Dyckia sp. ocorrem preferencialmente nas bordas dos afloramentos

Acima - também se aglomeram em pequenas bacias, repletas de areia, vegetando juntamente com Vellozia sp.

Acima - observam-se exemplares de coloração vinácea, lado a lado com outros que carregam a tonalidade tipicamente verde

Acima - recentemente floridas, algumas plantas carregavam cápsulas cheias de sementes

A Seguir - aspecto geral do habitat de Dyckia sp. revisitado


Acima - característico arenito em casco de tartaruga, ao lado do qual ocorrem as Dyckia sp.


Acima - as diminutas bromélias vegetam juntamente com orquídeas Epidendrum campestre

Abaixo - o autor do blog - Orlando Graeff - examina as minúsculas Dyckia sp. do Mato Grosso


terça-feira, 17 de outubro de 2017

TIRADENTES E SERRA DE SÃO JOSÉ – MINAS GERAIS – OUTUBRO DE 2017

Fazia mais de uma década, desde que visitara o topo da Serra de São José, que se debruça sobre a cidade histórica de Tiradentes, em Minas Gerais. Segui para lá, com objetivo de observar a situação geral da flora, na linha de cumeada deste maciço, assim como também para observar o florescimento de algumas espécies de bromélias e orquídeas, que coincide com a primavera. Realizei diversas excursões pela crista rochosa, sob um sol inclemente e seca severa, que vinha se estendendo outubro adentro.

A cumeada da Serra de São José oferece paisagens curiosas, em que se observa o encontro estratificado entre rochas metamórficas (quartzitos) e sedimentares encaixantes (arenitos), produzindo paisagens locais bastante movimentadas e repletas de blocos ruiniformes, que se debruçam sobre elevados paredões íngremes. Do alto de seu extenso patamar, que propicia longo percurso, entre verdadeiros jardins de campos rupestres, é possível admirar os mares de morros, em meio aos quais se encontra situada a bucólica Tiradentes.

Observe, através das imagens selecionadas, um pouco desse admirável jardim, em meio ao qual pude passar muitas horas, a observar os hábitos de diversas espécies de plantas adaptadas à vida dura, em ambiente tão extremo:

A Serra de São José – ao fundo – é moldura dominante, na região de Tiradentes, em Minas Gerais


Acima – Aspecto de uma velha estrada colonial, que ligava Tiradentes a São João Del Rey, através da Serra de São José, observando-se calçamento pé-de-moleque, implantado por mãos escravas

A seguir – Paisagens de campos rupestres, que revestem a Serra de São José, com suas diversas fisionomias, desde campos sobre rochas a campos entre rochas, além de florestas e cerrados miniaturizados pelo clima áspero e pelo fogo endêmico, que vem regularizando a vegetação, há séculos




A seguir – Restos semidecompostos de arenitos, muito friáveis, jazem sobre afloramentos rochosos, exibindo aspecto ruiniforme, que lembra fortificações primitivas, por vezes se assemelhando a formas animadas. Entre eles e SOBRE eles, vegetam inúmeras orquídeas, bromélias, cactáceas e aráceas curiosas, tirando partido de microambientes particulares





A seguir  – Uma arvoreta decorativa domina a paisagem, surgindo ora como elemento arbóreo propriamente dito, em meio aos campos, ora como arbusto intersticial, em fendas de rochas, no topo da Serra de São José (Eremanthus cf. glomerulatus – família Asteraceae)





Acima e Abaixo – Justicia riparia (família Acanthaceae) se adapta esplendidamente, desde as matinhas úmidas, no pé da serra, próximo a fios d’água, até na capoeira ressequida dos campos rupestres, na crista das montanhas



Acima – Bromelia sp. (família Bromeliaceae), na beira da velha trilha dos escravos

Adiante – O maior espetáculo da Serra de São José, neste início de primavera, era mesmo a vistosa floração da orquídea rupícola/saxícola Cattleya pabstii (outrora pertencente aos gêneros Laelia e Hoffmannseggella), cujas populações já foram drasticamente reduzidas pelo fogo e pela coleta criminosa, para finalidades comerciais



A variação de hábitos e microambientes de Cattleya pabstii, na Serra de São José, é simplesmente notável, vegetando desde em meio a massas de velosiáceas densas, até sobre a rocha quente e ressecada, passando por depósitos de areia e matéria orgânica, Semp[re sob sol pleno





A seguir – Outra espécie notável, que se apresentava em flores, no alto da Serra de São José, era a bromélia Dyckia argentea, cujo aspecto cinéreo e escultural agradava muito, quando contrastando com suas inflorescências alaranjadas e vistosas







Adiante – Algumas paisagens do alto da Serra de São José

Acima – Linha de cumeada, no rumo de Prados



Acima – A cidade de Tiradentes, com a igreja Matriz de Santo Antônio em destaque (abaixo)



Adiante – Aechmea distichantha é uma das bromélia tanque-dependentes que sobrevive no alto da Serra de São José




A seguir – Outra bromélia tanque-dependente da Serra de São José é a variedade “cuspidata” de Aechmea nudicaulis, que é bastante singular, na paisagem rochosa, da qual se destaca, pelo encarnado vivo de suas inflorescências



Acima – A discreta bromeliácea Cryptanthus tiradentesensis medra em frestas de rochas, por vezes sob restritos “oratórios”, em que se protege da radiação extrema da Serra


Acima – Assembleias de plantas extremamente adaptadas formam associações especializadas, que convivem perfeitamente, tirando partido da ambientação mútua: Arthrocereus melanurus (Cactaceae), Dyckia argentea (Bromeliaceae) e Vellozia sp. (Velloziaceae)

Acima – Arthrocereus melanurus (Cactaceae)

Acima – Orquídeas teretiformes extremamente resistentes à radiação solar, vegetando sobre blocos expostos, na Serra de São José (Acianthera teres)

A seguir – Efeitos nocivos do fogo, na Serra de São José: gradual empobrecimento da flora – algumas espécies adaptadas tiram partido da destruição massiva, ocasionada pelas chamas cíclicas, passando a dominar a paisagem




Acima – Hatiora salicornioides (cactaceae) esconde-se no abrigo entre duas rochas, escapando do fogo cíclico e da dessecação invernal

Acima – Decorativos Paepalanthus planifolius (Eriocaulaceae), em áreas saturadas de umidade