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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

FLORESTAS DE CALCÁRIO EM NOBRES – MATO GROSSO


               A região de Nobres, a nordeste de Cuiabá, no Mato Grosso, tem ganhado fama, por suas águas cristalinas, que nascem entre rochas calcárias, formando belas cachoeiras e rios mansos, onde turistas buscam contato com a natureza e realizam mergulhos contemplativos, para admirar peixes semidomesticados, que se aproximam das pessoas. Também há na região diversas cavernas, que atraem os visitantes, em busca de temas espeleológicos e aventuras subterrâneas. Porém, uma vez mais, não eram os atrativos turísticos convencionais que nos atraíam. As vegetações características constituíam nosso interesse maior, em Nobres e Rosário Oeste, municípios que concentram esse polo ecoturístico mato-grossense.

               Um gigantesco arco geológico corta os estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, desde o sul da região pantaneira, próximo à fronteira com o Paraguai, até o extremo nordeste do Mato Grosso, na bacia do rio Araguaia. É o Arco de São Vicente, formado em eras geológicas distantes, por força das colisões entre placas tectônicas. Somente nos últimos poucos milhões de anos, essa megafeição geomorfológica se foi revelando, pela gradual erosão das camadas sedimentares que a cobriam. A partir desse processo, vão sendo exumadas cadeias relacionadas ao soerguimento de imensos corpos intrusivos. Regionalmente, surgem cadeias que ganham nomes distintos, como por exemplo, Serra de Maracaju, no Mato Grosso do Sul, e Serra das Araras, acima dos limites norte do Pantanal. A região que Maurício Verboonen e eu visitaríamos, ao final de janeiro de 2013, representa disjunção que vai se ligar à lendária Serra do Roncador, centenas de quilômetros a nordeste, formando como que um grande S, que pode ser facilmente divisado, nas imagens-satélite disponíveis.

               A erosão dos dois últimos milhões de anos tratou de expor elevadas frentes de cuestas (paredões quase contínuos), onde arenitos e quartzitos são revelados e formam escarpas repletas de fragmentos de rocha e circundam soberbos inselbergs de calcário, que parecem castelos perdidos na paisagem. Já havíamos seguido essas paisagens calcárias, em diversas partes do país. Ao atravessar o leste de Goiás, na direção do norte de Minas Gerais, na primeira fase da Expedição Fitogeográfica 2012 (http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2012/04/do-centro-oeste-ao-norte-de-minas.html ), citamos essas feições características da paisagem, que costumam abrigar interessantes floras remanescentes de fases semiáridas do Pleistoceno. Em Nobres e Rosário Oeste, desta vez, examinaríamos florestas densas, que guardam íntimas relações com a Amazônia, apesar de representarem típicas florestas estacionais, ou seja, matas que enfrentam prolongados períodos secos, anualmente, perdendo boa parte de suas folhas.

               Nossa visita ocorreu em meio à estação chuvosa, época do apogeu vegetativo dessas florestas e cerradões. Na diminuta localidade de Bom Jardim, que pertence ao município de Nobres, nas cabeceiras do rio Cuiabá, visitamos florestas situadas ao redor, onde existe uma unidade de conservação - Parque Estadual da Caverna Azul - em fase de planejamento, além de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) pertencente ao SESC (Serviço Social do Comércio), que também mantém uma famosa RPPN, na região do Pantanal (Poconé – MT). Veja, nas imagens que se seguem, alguns aspectos das paisagens que examinamos, durante esta viagem:


Abaixo: Nobres, no Mato Grosso, vem se tornando conhecida por suas belezas naturais ligadas às águas cristalinas que nascem nos calcários, como a cachoeira da Serra Azul e o rio Triste, onde os turistas mergulham em meio aos peixes, como se estivessem num aquário a céu aberto.




A Seguir: Mas, o que nos levou a visitar a região foram suas vegetações características, que possuem influências amazônicas. Predominam cerradões e florestas estacionais (Seasonally Dry Tropical Forests – SDTF), onde se observam grandes árvores, apesar da intensa exploração realizada nos últimos anos.





Abaixo: O relevo regional caracteriza o que os geomorfólogos chamam de Pediplano Cuiabano, uma vasta zona de erosão milenar, da qual restam escarpas (frentes de cuestas) íngremes, e cujos sedimentos vêm formando a extensa depressão pantaneira.




A Seguir: Na região de Nobres e Rosário Oeste, predominam inselbergs (pequenos morrotes que restam da erosão generalizada) de calcário, sobre os quais vegetam floras particulares.






Acima: A bromélia que supusemos ser Encholirium lymanianum, mais tarde identificada pelos pesquisadores do Jardim Botânico do Rio de Janeiro como se tratando de Dyckia ferruginea. É uma das espécies características dos afloramentos de calcário, conquanto vegete também em outros tipos de rochas expostas, ao longo do Arco de São Vicente. Suas populações fazem lembrar aquelas de outras espécies deste mesmo gênero, que observamos na Caatinga, durante a Expedição Fitogeográfica 2012.

Adiante: Onde a floresta encontra as rochas calcárias, surgem micropaisagens admiráveis, onde raízes de figueiras imensas (Ficus spp. – família Moraceae) formam amálgama indissociável com rochas de superfície rugosa, que abrigam inúmeras outras plantas rupícolas.




Acima: Maurício Verboonen, ao fundo de uma fenda entre matacões de calcário, sobre os quais se enovelam raízes de velhas figueiras, lembrando cidades perdidas de antigas civilizações da América Central.
Abaixo: Nosso guia em Nobres – Sr. Veríssimo Francisco da Costa, conhecido como Bugio – posa junto a um conjunto de blocos de calcário, em meio à floresta densa.



A Seguir: Sobre frestas nas rochas calcárias, em grotas úmidas, próximas às diversas cachoeiras da Serra Azul, vegetam belas camadas de Selaginella sp. (família Selaginellaceae), além de bromeliáceas do gênero Pitcairnia e gesneriáceas que produzem delicadas flores arroxeadas.




Adiante: Nas encostas inclinadas, onde ocorrem solos mais espessos, entremeados com pilhas de fragmentos de rocha em decomposição, vegetam as mais densas florestas, nas quais se encontram elementos amazônicos e centro-brasileiros, relacionados às florestas estacionais (SDTF). A despeito de terem sido intensamente exploradas, essas matas ainda exibem grandes madeiros de espécies valiosas, tais como aroeiras, gonçaleiros, garapeiras, perobas e jequitibás.

Acima – Attalea speciosa é a palmeira dominante nas florestas da região, abrigando densas populações de samambaias-do-mato-grosso (Polypodium decumanum – família Polypodiaceae), na base de suas folhas

Acima – Grandes jequitibás-vermelhos (Cariniana rubra – família Lecythidaceae) ocupam solos mais úmidos, onde o sub-bosque é dominado por espécies adaptadas à saturação

Acima – Imensas lianas (cipós) revelam o estado de conservação das florestas locais. Alguns são mais idosos que as grandes árvores ao redor

Acima – Portentoso exemplar de peroba (Aspidosperma sp. – família Apocynaceae), em cujo tronco e galhos observamos orquídeas, tais como Cattleya nobilior
Abaixo – Maurício posa próximo a uma dessas enormes perobas de Nobres


Acima – Uma das características marcantes das florestas estacionais de Mato Grosso é a grande quantidade de samambaias trepadeiras e outras lianas que revestem o terço inferior dos troncos das árvores mais elevadas, assim como a quase totalidade dos menores exemplares

Acima – Torna-se difícil acreditar, ao visitar florestas luxuriantes como essas de Nobres, que o fogo as possa atingir, com relativa frequência. Mas, infelizmente, isso ocorre e ocasiona sérios danos à flora, como mostra esse flagrante obtido no coração da mata

Acima – Nosso guia Bugio posa ao pé de uma bela garapeira (Apuleia leiocarpa – família Fabaceae), cujo tronco decorativo se elevava no dossel da mata (Abaixo)


Acima – Aspecto geral da paisagem florestada da Serra Azul, próxima a Bom Jardim, em Nobres

Acima – Heliconia cf. psittacorum (família Heliconiaceae) é uma das plantas herbáceas mais numerosas do sub-bosque das florestas de Nobres

Abaixo: Buritizal (Mauritia flexuosa – família Arecaceae) junto a uma lagoa de Nobres



Acima: Um grupo de curicacas se prepara para mais um dia, nas pastagens de Bom Jardim, em Nobres.

A Seguir: O velho processo de devastação das florestas de Nobres, que abriu a vegetação, deixa revelações botânicas interessantes, tais como uma hemiepífita estrangulante (Ficus sp. – família Moraceae), cujas raízes formam caprichoso revestimento, no tronco de uma grande palmeira-babaçu (Attalea speciosa); e uma notável massa de orquídeas Cyrtopodium saintlegerianum, também a meio tronco de uma palmeira-macaúba (Acrocomia aculeata).



Acima – Orlando Graeff examina um belo exemplar de Philodendron sp. (família Araceae), na margem do rio Triste


Acima: O cerrado apresenta poucas flores, na época chuvosa. Essa bignoniácea é uma das poucas que encontramos em flores, próximo à represa do rio Manso.

Adiante: Aspectos do rio Cuiabazinho, afluente direto do célebre Cuiabá. Suas águas estavam turvas pelos sedimentos que seguiam na direção do Pantanal



Abaixo: Seção de imagem-satélite do Google Earth mostrando aspectos da região visitada - Notar a abrangência vasta do Arco de São Vicente



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