Worsleya procera –
família Amaryllidaceae
Imperatriz-da-serra
Imagine ter que percorrer longa e inclinada encosta,
atravessando densos emaranhados de capim, onde seus pés afundam, em meio ao
desconhecido, torcendo para se encontrarem longe as jararacas, àquela hora da
manhã; cruzando florestas de altitude e abrindo caminho entre as japecangas que
mais parecem navalhas afiadas; para depois ainda galgar perigosos aglomerados
de rochas soltas do tálus de uma
imensa rocha, sendo atacado por centenas de carrapatos-micuins famintos (sendo
severamente alérgico às suas picadas); para chegar ao pé de um paredão íngreme,
que se ergue acima de você, algumas centenas de metros, e olhar extasiado para
o que tanto buscou: velhas touceiras inatingíveis de rabos-de-galo (Worsleya procera – família Amaryllidaceae)
resistindo ao destino que parece ter-lhes sido traçado pelo homem – o desaparecimento.
Pois foi essa nossa experiência, no dia 13 de julho de 2017, quando saímos no rumo deste maravilhoso
encontro com uma admirável população disjunta dessa raríssima planta fluminense.
Guiava-me meu colaborador do JARDIM FITOGEOGRÁFICO
– Ezequiel Botelho – que passara sua
infância naquela região, tendo testemunhado a intensa coleta comercial dessa joia
botânica, nos idos dos anos 1980 – 1990, quando a planta conheceu fama e
celebridade, nos jardins de Itaipava e até mesmo fora do país. Garantia-me ele
que a planta ocorria por lá, bem distante de sua área mais conhecida de
ocorrência (Serra da Maria Comprida), o que era sabido naqueles tempos, mas
caíra no esquecimento dos cientistas e conservacionistas das últimas décadas.
Quis então me conduzir ao ecossistema, para que eu conferisse essa ocorrência.
A zona central de ocorrência de Worsleya procera (até pouco tempo conhecida como W. rayneri) é mesmo a Serra da Maria
Comprida, onde o Botânico Gustavo
Martinelli estudou minuciosamente suas populações, entre os anos 1980 e
1990. Também estende sua presença ao trecho montanhoso entre o bairro
petropolitano do Retiro e a RPPN
Graziela Maciel Barroso, próximo à BR040 (ver link - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/11/rppn-graziela-maciel-barroso-novembro.html ). Mas, mesmo essas disjunções se relacionam
de modo proximal àquela Serra da Maria Comprida, tendo sido todos esses núcleos
intensamente coletados, de forma criminosa, até os dias atuais, o que ajudou a
levar a planta ao limiar de estado criticamente ameaçado.
O que dizer dessa população da planta, segregada mais de 14km de sua área central de ocorrência
e 18km da RPPN Graziela Maciel
Barroso? Entre essas áreas, estende-se imensa área deprimida, na qual dominam
terrenos colinosos, em altitudes incompatíveis com a ecologia dos
rabos-de-galo, nos quais ela não poderia ter sobrevivido, mesmo antes da
chegada do ser humano à Região Serrana de Petrópolis. Sabemos que a espécie não
se propaga facilmente, sequer o fazendo por transporte em correntes de ar ou de
carona digestiva de aves e outros bichos. Como poderíamos explicar esse padrão
disjunto de ocorrência, até os dias atuais?
Ao longe, podia-se
observar a Serra da Maria Comprida, onde estão os principais habitats do
rabo-de-galo
Tais indagações não serão respondidas aqui, no nosso blog
das Expedições
Fitogeográficas, pois demandariam longas reflexões, que não são
objeto para este espaço. Vamos observar aspectos desta excursão, sendo que você
ainda poderá ver mais numa postagem de 01
de dezembro de 2014 (link - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2014/12/excursao-ao-habitat-de-hoffmannseggella.html ), que relata uma outra excursão à Serra da
Maria Comprida, na Zona de Vida Silvestre da APA-Petrópolis.
Abaixo – Aspecto internos da floresta de altitude, na área abaixo
do habitat de Worsleya procera,
bastante similar fisionomicamente àquele das matinhas de altitude da RPPN Graziela Maciel Barroso, onde
também ocorre o rabo-de-galo. Aqui, no entanto, mostra-se mais seca e menos
abundante de epífitas, por ser mais continental
A Seguir – Imagens que mostram o novo habitat de Worsleya
procera, examinado nesta data
Fotos adiante – A competição mostra ser um dos aspectos da
prosperidade das plantas, nos paredões de pedra da região, como seria de se
imaginar: Worsleya procera trava
combate constante com plantas como Alcantarea imperialis (família
Bromeliaceae), também ela uma planta ameaçada pela coleta criminosa
Acima – Muitas plântulas
de rabo-de-galo caem dos paredões, durante enxurradas ou quedas de placas de
gnáisse, que varrem continuamente essas ilhas de plantas rupícolas. Algumas
delas ainda resistem bravamente, em meio à vegetação de tálus, no pé da imensa
rocha (base da foto ao centro). Não resistirão por muito tempo
Orlando Graeff posa junto a uma das belas plantas de Worsleya procera
Ezequiel também foi fotografado, escrevendo seu nome nas atividades
científicas exploratórias
Abaixo – O padrão de
ocorrência de Worsleya procera é bastante definido: prefere encostas voltadas
ao quadrante norte e aparece em manchas com limites quase artificiais. Para
além do ponto onde Ezequiel ascende o paredão rochoso, nenhuma planta sequer
será encontrada, reaparecendo mais de mil metros além, numa outra encosta de
orientação cardeal similar à primeira
Acima – Quase sempre se poderá encontrar algum rabo-de-galo em
flores, embora não fosse esta sua época preferida.
Abaixo – Grupo de rabos-de-galo exibindo cápsulas de sementes,
aparentemente já abertas. Não pudemos encontrar, contudo, nenhuma planta jovem
nesta encosta
Acima – Ezequiel afirma
que as populações de Worsleya procera eram bastante mais
numerosas, há anos. A coleta criminosa parece ter sido responsável pela
drástica redução do número de plantas, embora o avanço das atividades
agropecuárias e o fogo andem sempre por perto. Uma coisa é certa: a maioria
delas está hoje longe do alcance de catadores menos esforçados
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