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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

PASSAGEM POR UMA PAISAGEM DE CALCÁRIOS, NO NORTE DE MINAS GERAIS – OUTUBRO DE 2018


Quiabentia zehntnerii  curiosa cactácea dos afloramentos de calcário do Norte de Minas

A caminho da Chapada Diamantina, na Bahia, onde iríamos procurar o habitat de orquídeas, atravessamos uma serrania de calcários, situada próximo à localidade de Capitão Enéas, na região de Montes Claros, norte de Minas Gerais. Havia anos que passava por aquele conjunto de afloramentos rochosos, à margem da rodovia que leva a Janaúba, atraindo-me a curiosidade de conferir-lhe a flora e a natureza de sua vegetação. Sempre acompanhado de Maurício Verboonen, esperávamos chegar à localidade de Ibicoara, na Bahia, tendo muitas centenas de quilômetros à nossa frente. Porém, isso não nos aplacou a curiosidade naturalista e tratamos de buscar uma via até o topo do ressequido conjunto cárstico, que se eleva na paisagem, à forma de inselberg vestigial de antigos processos erosivos do rio São Francisco.

O rio São Francisco, corre a cerca de 100km oeste do local, enquanto a Cadeia do Espinhaço se eleva pouco mais perto, a leste – 30km. Viajávamos pela margem direita do Velho Chico, que vem escavando seu vale há milhões de anos, deixando para trás extensa planície arrasada, tendo restado interessantes serranias-relíquia, de natureza calcária. Esses testemunhos mergulharam, há muito, na semiaridez que se inicia no norte de Minas Gerais e domina o longo sertão deprimido, daí até o Nordeste. É a faixa do Sertão da Caatinga, de que tratamos em nosso livro Fitogeografia do Brasil, Uma Atualização de Bases e Conceitos (NAU Editora, 2015 – veja o link: FITOGEOGRAFIA DO BRASIL ).

À forma de stepping-stones, esses rochedos calcários abrigam populações de plantas típicas do Sertão, destaque para as cactáceas e algumas bromeliáceas do Semiárido. Mas, também essências arbóreas da Caatinga habitam esses fragmentos e dão conta de períodos de maior aridez pretérita. Seguindo ao norte, na direção e sentido da Bahia, essa vegetação fragmentada vai se colmatando, para dar lugar à Caatinga, em definitivo, naquele estado. A floresta-seca ou floresta estacional decidual da Jaíba, que outrora se estendia pelos vales de Janaúba a Montes Claros, há muito desapareceu, mercê do desenvolvimento da agropecuária. Desse modo, ao se visitar um fragmento cárstico, como esse de Capitão Enéas, tem-se a impressão de que a vegetação catingueira dominava toda a paisagem, o que não é verdade.
Para conferir um pouco mais do que deve ter sido o cenário desta paisagem contrastante de Capitão Enéas, poderá ser examinada a postagem que conta sobre outra visita à região, em Itacarambi, no Parque Nacional das Cavernas do Peruaçu, não muito distante dali (ver - CAVERNAS DO PERUAÇU). Daquela feita, eu buscava dados de campo a respeito das lendárias Matas do Jaíba e de suas notáveis barrigudas ou embarés (Cavanillesia umbellata – família Malvaceae), de forma a figurar na referida obra de Fitogeografia de 2015.


Veja adiante as imagens comentadas desta visita:

A seguir – Uma estradinha pedregosa e de difícil acesso nos levou até a encosta da serrania calcária de Capitão Enéas, MG. Afloram calcários, cujo efeito drenante na paisagem atrai flora catingueira, de índole semiárida


Acima – Os vales ao fundo dão conta da existência de antigas florestas estacionais relacionadas à Mata do Jaíba, que costumava ocupar solos férteis e topografias planas. Hoje, nada mais comportam que pastagens e indústrias de moagem de calcário

Adiante – O exame interno da vegetação não deixa dúvidas a respeito da índole catingueira da flora. Desde suas árvores, até suas bromélias e cactáceas, tudo mostra padrões de dispersão perfeitamente coerentes com a Caatinga



Acima – Uma das árvores mais notáveis do lugar é representante das caatingas baianas e pernambucanas, centenas de quilômetros acima – Commiphora leptophloeos (fam. Burseraceae). A casca descamante é típica da planta

A seguir – O mandacaru (Cereus jamacaru – fam. Cactaceae) é espécie indicadora da Caatinga, com seus longos cladódios, ocupando solo e até as rochas suspensas





Acima – Não encontramos embarés nesta região, mas as paineiras-barrigudas estavam presentes (Ceiba glaziovii – fam. Malvaceae), com seus troncos repletos de espinhos. Notar a presença dos facheiros (Pilosocereus pachycladus – fam. Cactaceae), em meio às demais cactáceas ao redor
Abaixo – Detalhe do tronco de Ceiba glaziovii, tendo diminuta bromélia do gênero Tillandsia estrategicamente escondida dentre seus espinhos aguçados



A seguir – Um lindo exemplar de ipê-roxo (Handroanthus cf. eptaphyllus – fam. Bignoniaceae) florescia ao lado da estradinha poeirenta, alegrando a vista




A seguir – Cactáceas arbustivas se espalham por todos os lados, sendo que esta espécie, inicialmente identificada como Opuntia ficus-indica (o famoso figo-da-índia) era bastante importante. A partir da colaboração técnica do amigo Biólogo Pedro Nahoum e do especialista Marlon Machado, a identidade da planta foi esclarecida: Tacinga saxatilis 






A seguir – A mais curiosa cactácea dos afloramentos calcários de Capitão Enéas era Quiabentia zehntnerii, que chega a confundir o olhar menos experimentado, assemelhando-se às ora-pro-nóbis do gênero Pereskia, pelas estruturas foliares, no ápice dos cladódios







Acima – As cactáceas esféricas do gênero Melocactus são comuns a partir deste setor da Caatinga, sendo conhecidas popularmente por coroas-de-frade. Este exemplar, em fase reprodutiva, sugere ser Melocactus zehntnerii, assinalado para a região, embora sua taxonomia seja muito sutil. Abaixo – Melocactus cf. zehntnerii vegetando diretamente sobre a rocha nua



A seguir – Bromeliáceas espinescentes abundam sobre o solo ou sobre as superfícies de rocha calcária, destaque para Encholirium spectabile, que é espécie indicadora da Caatinga




Adiante – Macambiras (Neoglaziovia variegata) são bromélias marcantes, formando densas populações e florescendo lindamente. São plantas têxteis e já foram muito exploradas, no passado, para a indústria de forrações. Suas folhas variegadas lembram espadas-de-são-jorge, plantas domésticas de nossas cidades





Acima – Em meio à caatinga de primavera, com folhas novas devidas às recentes chuvas, avistamos um bando de saguis-de-tufo-preto (Callithrix penicillata), que buscava alimentos e parou para nos observar







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