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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

LA CORONILLA – URUGUAY – ONDE A PAMPA ENCONTRA O OCEANO


               O litoral uruguaio é um conjunto de paisagens singulares, onde o oceano revolto explode contra praias semisselvagens e pontões rochosos de granito rosa, tendo em frente a si as mais admiráveis paisagens da Pampa Meridional: Fazendas de extensas pastagens verdejantes, nos quais pastam rebanhos do mais puro gado europeu. Durante um pequeno período de verão, localidades como Punta Del Leste – o mais famoso balneário uruguaio – La Paloma e alguns outros chegam a ficar repletos de veranistas, que aproveitam a janela de calor e sol. Nesta época do ano, em que por ali passamos, em nossa Expedição Fitogeográfica 2012 (24 e 25 de setembro), a região costuma estar bem vazia, tendo sido esta exatamente a intenção, de forma a não concorrermos com o turismo, em nossas atividades científicas.

               Não contávamos, evidentemente, com a forte frente fria que se deslocou tardiamente da Antártida e avançou sobre Uruguay e Brasil, chegando a produzir neve na região dos campos de cima da serra, de onde viéramos, dias antes. O agradável Hotel Jardim Oceânico, em La Coronilla, que se tornou a sede de nossas atividades, enquanto examinávamos as paisagens naturais da região, transformou-se num abrigo invernal, com a lenha queimando nas lareiras de seu amplo salão, produzindo ambiente alpino e fazendo-nos esquecer, ao lá dentro estarmos, que nos encontrávamos poucos metros distantes do Oceano.

               As andanças pelos campos e morros, ao redor da Laguna Negra, onde se concentravam nossos interesses, se transformaram em penosas atividades, sob temperaturas que variavam de 6oC e 8oC e ventos cortantes, que dificultavam sequer a produção de imagens, fora do automóvel. Chuvas ocasionais se alternavam a momentos de céu claro e a sensação térmica era negativa. Mas, como não poderia deixar de ser, tivemos sucesso, uma vez mais, na observação e interpretação das paisagens botânicas dessa região limítrofe ao Rio Grande do Sul, na qual encontramos importantes informações sobre os ecossistemas relacionados à Pampa – como temos preferido nos referir ao curioso bioma dos campos sulinos, assim, no feminino, como é tratado no cancioneiro nativo.

               Veja a seguir algumas imagens que dão conta dos cenários do litoral uruguaio, sempre imaginando como foram elas obtidas, debaixo do rigor do vento Minuano, que tem grande responsabilidade na origem de seus cenários:

A Seguir – As áreas mais deprimidas, ao redor da Laguna Negra, exibem campos sobre solos saturados de umidade e até mesmo áreas pantanosas, onde se abrigam aves as mais diversas. Seu mais admirável habitante é mesmo o cisne do-pescoço-negro, que forma bandos numerosos.




Abaixo – O lento processo de assoreamento e eutroficação dos banhados, de entremeio às colinas arredondadas de La Coronilla e Laguna Negra, é capitaneado por vastas populações de ciperáceas (Cyperus sp.), que toleram o ambiente encharcado.



Adiante – Qualquer elevação do terreno, onde as árvores consigam meter suas raízes, acima do lençol freático suspenso da Pampa, permite o surgimento de florestas subtropicais. Não há dúvidas de que outrora essa região era composta por mosaicos complexos de vegetações abertas e florestas subtropicais. Hoje, torna-se difícil sua interpretação – Mas não há como negar o legado decisivo das ações humanas.



Cerros (como são chamadas as serras montanhosas no Uruguay) de matacões rochosos se elevam até mais de uma centena de metros, numa região em que as altitudes giram monotonamente ao redor dos 15m. Nessas morrarias, medram florestas subtropicais, com arranjos florísticos bastante particulares, apesar de muito alterados pelo homem.


AbaixoTillandsia aeranthos foi a única bromeliácea epífita observada nessas matinhas enfezadas de La Coronilla.



A Seguir – Os lendários palmares de butiás (Butia odorata) são indubitavelmente a paisagem botânica mais admirável da região da Laguna Negra. Paira certo caráter enigmático em torno de tão vastas populações homogêneas de palmeiras, espetadas sobre os campos de solos saturados de umidade dessa parte do Uruguay. Não se pode ter dúvidas, no entanto, de sua origem antrópica e associada ao pastoreio do gado – Não existem plantas jovens nas áreas de pastagem, somente surgindo fora dos aramados, onde escapam do gado.







Acima - Ema solitária na Pampa

Abaixo – Aspecto de uma canhada – como são chamados os pequenos cursos d’água que cortam serenamente os campos sulinos. As florestas ciliares nos mostram bastante sobre a flora da região.






Acima - A Fortaleza de Santa Teresa remonta ao período colonial, quando Portugal e Espanha disputavam as terras que hoje pertencem ao Uruguay. O granito rosa, de que é feito, agregou-se de linda camada de liquens que o tornaram amarelado, chamando atenção à distância.

Abaixo – Fragmentos da vegetação subtropical litorânea ainda podem ser admirados, próximo à Fortaleza de Santa Teresa, sendo hoje raros, pela intensidade da exploração florestal, cujo principal elemento produtivo é o eucalipto.





A Seguir – O Mar revolto briga incessantemente com os afloramentos de granito rosa que, terra adentro, abrigam excepcionais regiões vinícolas.



terça-feira, 25 de setembro de 2012

CAMPOS NEUTRAIS – BANHADOS DO TAIM E RIO GRANDE


               A Expedição Fitogeográfica 2012 continua: Entre os dias 23 e 24 de setembro, partindo de Caxias do Sul, onde se fizera parada estratégica, deixamos a região dos campos de cima da serra e da Araucarilândia, para adentrar de vez na região dos Pampas. Uma parada foi realizada em Rio Grande, na barra da Laguna dos Patos, tendo completado a região dos Campos Neutrais, no dia seguinte, quando atravessamos os Banhados do Taim.

               Esta fase da viagem foi fundamental para compreender a natureza dos campos da região lagunar e litorânea do Rio Grande do Sul, cuja área mais típica encontra-se nos Banhados do Taim. Tratam-se de campos sobre solos saturados de umidade e possuem inegável influência humana, conduzida através de diversos séculos de exploração pecuária e agrícola.

               Foram outrora complexos mosaicos de florestas subtropicais e vegetações de índole palustre e campestre. Hoje, apresentam-se generalizadamente abertas, restando alguns fragmentos da vegetação florestal palustre, onde avistamos também vistosas populações da orquídea Cattleya intermedia, que havíamos observado nas várzeas catarinenses, dias antes.
A seguir, algumas imagens obtidas na passagem pelos Campos Neutrais, antes de adentrarmos o Uruguay:

Imagens a seguir – A bela orquídea Cattleya intermedia, que avistáramos em Santa Catarina, dias antes (ver - Uma Floresta Atlântica Subtropical Existiu Aqui – Litoral de Santa Catarina postagem do dia  17/09/2012), encontrava-se também em flores sobre as árvores que circundam os pantanais de Rio Grande.







A seguir – Aspectos da floresta subtropical que circunda o sistema lagunas dos Patos: As árvores dominantes são Erythrina crista-galli (família Fabaceae) e Ficus guaranitica (família Moraceae), sendo também as principais árvores-suporte das orquídeas e bromélias da região.




Abaixo – A bromélia Tillandsia aeranthos é uma das espécies mais abundantes das regiões de fortes ventos dos campos sulinos. Vegetam até mesmo em praças e ruas das cidades.



Adiante – Aspectos da cidade portuária de Rio Grande, na Laguna dos Patos. O nascer do dia, de cores douradas, prenunciava dias frigidíssimos, que sobreviriam.




A Seguir – Algumas atraentes imagens dos Campos Neutrais, na região dos Banhados do Taim: Campos sobre solos saturados de umidade e florestas subtropicais.










sábado, 22 de setembro de 2012

OS CAMPOS DE CIMA DA SERRA E O CÂNION DO MONTENEGRO – SÃO JOSÉ DOS AUSENTES - RS



               No dia 14 de setembro, depois de cruzarmos extensa região de campos e florestas de araucárias, chegamos à Pousada Fazenda Montenegro, no município gaúcho de São José dos Ausentes. Ficamos hospedados sob os cuidados da família Pereira, que brinda o viajante com os mais bem conservados aspectos dos costumes gaúchos. Ali se encontra a rusticidade e a simplicidade da vida nas fazendas dos campos de cima da serra, com destaque para a culinária campeira organizada por Anápio Pereira, persistente defensor das tradições dos galpões (WWW.fazendamontenegro.com.br).

               Estávamos a poucos quilômetros do Pico do Monte Negro, ou Montenegro, como deveria ser a grafia mais adequada. O pico é o ponto culminante do Rio Grande do Sul, com mais de 1.400m de altitude, mas não representa aquilo que o viajante poderia imaginar como tal. Trata-se de uma elevação relativamente discreta, sobre as planuras dos campos de cima da serra, representando um morro testemunho de milenares processos de degradação de relevos basálticos da Serra Geral. Porém, seu aspecto mais marcante constitui em estar situado em imediata justaposição às estonteantes escarpas do cânion Montenegro, que ficou famoso, há alguns anos, quando se tornou cenário de uma reconstituição perfeita de batalhas revolucionárias da série televisiva A Casa das Sete Mulheres.

               O cânion de Montenegro, que examinamos detalhadamente, na manhã de 15 de setembro, é um admirável conjunto de paisagens relacionadas à evolução dos relevos tabulares dos campos de cima da serra, formação de máximo interesse para a Fitogeografia. Faz parte de uma cadeia de diversas outras escarpas íngremes, com quase 1.000m de paredões basálticos, sob cujo sopé se estende a planície marinha de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. São conhecidas como Aparados da Serra, sendo formadas pela erosão de falhas profundas nessa que é a maior formação de basaltos do Planeta: A Formação Serra Geral, que ocupa grande parte da bacia do rio Paraná, até o Centro-Oeste.

               Falar de campos sulinos, até mesmo de campos em geral, no Brasil, sem estudar os campos de cima da serra, seria de fato uma grande omissão. Já afirmamos que eles se relacionam intimamente com o domínio das florestas mistas de araucárias (Araucaria angustifolia – família Araucariaceae), que F. C. Hoehne chamou de Araucarilândia. De fato, o exame dos campos limpos, que cercam penhascos vertiginosos, no cânion do Montenegro, mostrou claramente suas relações mútuas – campos e florestas de araucária – onde incríveis miniaturas dos imensos pinheiros-do-paraná são criadas pelo estresse de solos muito rasos e dos ventos fortíssimos, que açoitam a paisagem, por vezes fazendo a temperatura descer muito abaixo de zero grau.

               Durante o restante do dia, pudemos percorrer diversos pontos de grande interesse, na região de São José dos Ausentes, como resolvemos mostrar nas fotografias adiante, de forma a não cansar os leitores do blog Expedição Fitogeográfica 2012:

Abaixo – O pico do Montenegro é uma elevação convexa, ao lado do vertiginoso cânion do Montenegro, cujos paredões de basalto se projetam abruptamente, na direção do litoral catarinense. Numa segunda imagem mais aproximada, tentamos mostrar alguns visitantes avistados de longe, de forma a tornar mais claras as dimensões dos penhascos.




 

Acima – Pequena serpente da família Colubridae, que foi surpreendida, ao atravessar nosso caminho, em meio aos campos de cima da serra – animal inofensivo.
Adiante – Orlando Graeff posa ao lado de uma floresta de altitude dos aparados da serra, junto ao cânion Montenegro. Essas florestas subtropicais são duramente fustigadas pelos ventos gelados, que sopram o ano inteiro, determinando congelamentos, neve e estresse fisiológico.



 


As últimas fotos da série acima mostram as delicadas orquídeas Hadrolaelia coccinea (=Sophronitis coccninea), que medram aos milhares, nas florestas miniatura das bordas dos cânions, onde permanecem protegidas pelos penhascos.
Abaixo – Riachos murmurantes se formam sobre os campos de cima da serra, onde o lençol freático permanece constantemente suspenso, poucos centímetros abaixo da relva. Ao encontrarem os penhascos, despencam em cascatas inacessíveis de grande beleza, que vão se escalonando, encosta abaixo, como mostra a imagem a seguir.

 

Adiante – Nas bordas dos penhascos, com quase mil metros de paredões íngremes, medram lindas bromélias Aechmea recurvata, que exibiam suas rosetas avermelhadas, juntamente com curiosas cactáceas do gênero Parodia e orquídeas do gênero Maxillaria, que floresciam longe das mãos dos eventuais coletores.



 Adiante – Alguns aspectos da paisagem do cânion do Montenegro, tendo a baixada catarinense e suas colinas litorâneas aos seus pés.





Acima – Os pinheiros-do-paraná ou araucárias (Araucaria angustifolia), usualmente representando enormes árvores, surgem na forma de miniaturas, nas bordas do cânion Montenegro, junto ao pico do mesmo nome.

Abaixo – A queima dos campos de cima da serra é assunto polêmico, contrapondo estancieiros e conservacionistas, cada um apontando suas razões, seja para realizá-la, seja para criticá-la. A matéria precisa ser vista com extremo cuidado e fatoração conjunta econômico-social e científica.



Acima – O Cachoeirão do Rodrigues é um característico exemplo do escalonamento das camadas de basalto da Formação Serra Geral: Patamares formados a partir da gradual exposição dos diversos níveis da rocha.
Abaixo – Aspecto da queima dos campos de cima da serra, que é induzida pelos estancieiros, a cada três anos, em média, com a finalidade de renovar seus pastos. A dinâmica de manutenção desta paisagem se encontra diretamente relacionada com o fogo.


A seguir – Aspecto da vida cotidiana das estâncias dos campos de cima da serra, em São José dos Ausentes.


Adiante – Uma vista interna de fragmento de floresta subtropical, que se entremeia às araucárias do planalto da Serra Geral; E um morrote testemunho da longa história de escultura dos relevos tabuliformes da Serra Geral, por detrás dum fragmento de floresta subtropical mista de araucárias.



Abaixo – Vista de uma estância típica dos campos de cima da serra, no Rio Grande do Sul.


Abaixo – Estradinha cortando trecho de pinheirais quase puros. Essas paisagens quase se extinguiram, no Século XX, por conta da exploração descontrolada da madeira das araucárias.


A seguir – Imagens de outra formação vegetacional em franca extinção: As florestas de xaxim (Dicksonia selowianna – família Dicksoniaceae). Essas samambaias arborescentes também foram intensamente exploradas para retirada do xaxim, para confecção de vasos para plantas ornamentais. Hoje, assim como as araucárias, sua retirada está proibida por lei.