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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

terça-feira, 15 de maio de 2012

INVESTIGAÇÕES PARA-ACADÊMICAS: O FITOGEÓGRAFO E SUAS VIAGENS


               A primeira fase da Expedição Fitogeográfica 2012 terminou no dia 11 de maio, quarenta e dois dias depois de eu ter deixado Petrópolis. Foram 13.200km rodados pelos estados de Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, Bahia, Piauí, Maranhão, Pará, Ceará, Pernambuco e Sergipe, além de uma passagem rápida pelo Espírito Santo, por onde retornei, através da BR-101. A viagem representou experiência ímpar, proporcionando contemplação e reflexão de extrema importância sobre domínios naturais que ainda me eram insuficientemente familiares: Principalmente a Caatinga e a Mata de Cocais.

               As principais dificuldades que enfrentei dizem respeito à infraestrutura de nosso país, que é das piores, especialmente no que concerne às suas estradas, puxando a rede de hospedagem, alimentação e comunicação. Há sinais de melhora, não se pode negar: Muitas rodovias vão sendo asfaltadas e não cheguei a enfrentar a buraqueira que, um dia, conheci pelas estradas do Centro-Oeste. Mas, o incremento descomunal de tráfego, por conta da equivocada opção brasileira pelo transporte rodoviário, em detrimento de ferrovias, já pôs em xeque, faz algum tempo, as condições razoáveis de segurança e organização do sistema viário nacional: Viajar por tantos quilômetros, pensando sempre na segurança, transformou-se no foco de meus cuidados.

               A quase inteira malha viária do Nordeste é ocupada por rebanhos dispersos de caprinos e por muares (jegues), que vagam de modo desordenado, causando acidentes graves, sem que as autoridades movam qualquer esforço, de forma a coibir este nefasto costume. A tradição de criação à solta, principalmente de caprinos, é incompatível com o que se vem propondo, neste surto de desenvolvimento, que tomou conta do país. Os caprinos, aliás, possuem notável importância fitogeográfica, no Semiárido, que rivaliza com o fogo do Centro-Oeste, na determinação da fisionomia de suas paisagens botânicas.

               Em determinadas regiões do Nordeste, também senti a pressão da falta de segurança que assola o país, em virtude do fracasso das políticas públicas nesta área. Há muito, vem sendo mitigada a miséria extrema, que um dia já assolou o Nordeste. Poucas vezes me deparei com as condições degradantes que se tornaram comuns, nos noticiários dos anos de 1960 a 1980. Porém, mesmo assim, ainda surgem nos mapas rodoviários indicações vergonhosas como: “Atenção, o trecho entre esta ou aquela cidade apresenta alto índice de assaltos”. Mais do que alertas nos guias rodoviários, a voz geral dos habitantes dessas regiões confirmava tal estado vergonhoso, nem sempre coincidindo com aquelas localidades que, no passado, se envolviam na miséria extrema. Assim, em muitos trechos, minhas observações da natureza eram dificultadas, uma vez que viajava sozinho, na maior parte do percurso.

               Afora as condições de alimentação e hospedagem, que não chegam a causar espanto ao viajante experimentado e precavido, a dificuldade de comunicação se mostra um sério entrave para o desenvolvimento dessas regiões longínquas que visitei. Tanto se fez notar para mim, durante a viagem, quanto para os leitores deste blog. A consulta aos mapas e imagens do Google Earth, que tentara proceder, ao início da jornada, acabou se mostrando impossível, mais adiante. A velocidade das conexões da internet é incipiente e não faltaram situações em que tive que adiar a postagem do blog, por conta de não conseguir condições mínimas de tráfego de dados.

               Mas, a despeito dessas pequenas dificuldades, posso afirmar que tive sucesso total, em meus objetivos de naturalista para-acadêmico: Consegui máximo aproveitamento, nessa tarefa que apenas nós, fora da Academia, conseguimos realizar – Reflexão Independente. Essa é a proposta dos para-botânicos, qual seja analisar a natureza, de forma independente de linhas de pesquisa decididas dentro de instituições ou órgãos de pesquisa. Isso não corresponde, de forma alguma, a uma suposta rebeldia ao conhecimento oficial, que tanto avança nas universidades. Constitui apenas uma opção intelectual pela livre escolha dos temas a serem pesquisados. Tanto é que, de forma inevitável, dependemos do notável acervo de conhecimentos associado às instituições.

               O para-acadêmico somente conseguirá atuar onde não sejam impositivas tarefas de Estado, como seriam os casos de levantamentos botânicos e faunísticos; mapeamentos e cartografia; além de prospecções geológicas etc. Missões como essas, não temos dúvidas, somente prosperam a partir de programas subvencionados pelos governos. Mas, quando o caso for de reflexão, tal como vem sendo o meu, nada mais apropriado que a liberdade de escolha de uma linha científica, sem as amarras de objetivos que não foram decididos por nós. A Fitogeografia, da forma como a venho revisando, integrando regiões diversas do país e confrontando linhas as mais diversas de abordagem, somente poderia ser encarada desta forma.
Meu trabalho foi acolhido, de forma empolgada, por todas as pessoas com as quais tive que me avistar, ao longo desta fase da Expedição Fitogeográfica 2012. Tantas pessoas me ajudaram, com tanto entusiasmo, que somente pude constatar que me encontro na direção certa e nela prosseguirei. Agradeço a todos os que me ajudaram, cada um de seu modo e cada um como pôde. Fica a promessa de que levarei em conta este compromisso, ao avançar com minha obra, antecipando meu reconhecimento a todos.
Como brinde, seguem mais algumas imagens interessantes desta Expedição Fitogeográfica 2012:



Os guarás são aves de beleza incomparável. Habitam os manguezais do Pará e do Maranhão e somente adquirem sua coloração por comerem pequenos caranguejos, dos quais emprestam a pigmentação.



As marés do Nordeste podem atingir diferenças de até sete metros, produzindo diferentes paisagens, entre a preamar e a baixamar, como se percebe nesta imagem das praias de Alcântara, no Maranhão.



Belos caminhos florestados da região de Ilhéus e Itabuna. Somente a cultura do cacau sombreado foi capaz de garantir a conservação das florestas da Costa do Cacau, na Bahia.



Os cenários de intensa erosão natural caracterizam os relevos do Nordeste Semiárido e podem servir para entender um pouco do passado climático do Brasil. A seguir: Serra da Capivara, no Piauí, e Serra dos Dois Irmãos, na divisa entre Pernambuco e Piauí.






A Serra do Ibiapaba se eleva até cerca de 1.000m, no sertão do Ceará, fazendo surgir florestas densas, em meio à Caatinga, e determinando o surgimento de inúmeros rios importantes, que correm para o Nordeste Oriental e para o Piauí.



Na região de Crateús, no Ceará, observam-se altiplanos residuais, que se estendem como tepuis, cobertos por vegetação de carrascos, que são florestas secas em miniatura.




Delicadas bromélias de flores alvas (Tillandsia tenuifolia), em meio às matas de cipó de Vitória da Conquista, na Bahia.



As belas praias de Itacaré, na Bahia, onde a Mata Atlântica se derrama sobre o mar revolto.




Da erosão milenar do antigo Planalto Atlântico, restaram cadeias de afloramentos graníticos, que um dia já estiveram sob a terra e hoje formam magníficos monumentos e inselbergs, no Vale do Jequitinhonha, entre a Bahia e Minas Gerais.



Estrada na divisa entre o Piauí e o Maranhão, onde surgem curiosos mosaicos entre agrestes, savanas e matas de babaçu, no portal da Mata de Cocais.



Blocos caóticos de quartzito e arenito se projetam contra o céu, em meio aos singulares cerrados de Grão Mogol, na interface entre o Cerrado e a Caatinga.



Grandes mandacarus (Cereus jamacaru – Cactaceae) marcam a paisagem da caatinga mais seca de Milagres, no sertão da Bahia.


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