Subindo a Serra do Corvo Branco (ver
postagem anterior), adentramos o Planalto da Serra Geral, em Santa Catarina,
onde está situada a região serrana de Urubici, uma das mais frias de nosso
território. Urubici está situada a mais de 900m sobre o nível do mar. A cidade
está encravada num vale agradável, espremido entre montanhas que nada mais são
do que remanescentes do velho planalto basáltico da Formação Serra Geral, que foram escavados e erodidos, ao longo de
milênios. O Parque
Nacional de São Joaquim protege grande parte destes morros, que se
elevam a mais de 1.300m e são abrigo para alguns dos últimos ecossistemas
realmente preservados de araucárias e campos de cima da serra.
Em nosso livro – Fitogeografia do Brasil, Uma Atualização de Bases
e Conceitos (NAU Editora, 2015), tratamos exaustivamente dessas duas
paisagens contrastantes (campos de cima da serra geral e florestas de
araucária), mostrando o embate entre as duas, ao longo dos últimos dois milhões
de anos do Quaternário. Em Urubici, nossa meta era visitar remanescentes de
florestas subtropicais de altitude, que se entremeiam às matas mistas de
araucária e, em nosso ver, representam comunidades singulares e distintas
daquilo que se convencionou chamar de floresta mista de araucárias. Esta
última, na verdade, contém a floresta subtropical, embaixo de si, mas que
poderá ser encontrada sozinha, nos vales enfurnados, onde a araucária não
consegue penetrar.
Mas, vamos às imagens e, ao longo de nosso
passeio, realizado em 18 de dezembro de 2015, poderemos apontar alguns aspectos
dessas matas escuras e permanentemente úmidas, que fomos encontrar, admiravelmente
bem conservadas, na Cachoeira da Neve,
em Urubici:
Abaixo – A Cachoeira da
Neve está preservada numa reserva particular e recebe este nome por causa de um
curioso fenômeno, que é a formação de neve, no salto principal, em dias
perfeitamente claros, quando ela não é observada em outros locais
Este
curioso fenômeno, que pudemos observar em fotografias a nós exibidas pelo Sr.
Hélio, proprietário da reserva, é na verdade devido à fina pulverização das
águas do primeiro salto (foto acima), que resulta na cristalização das
gotículas microscópicas, em forma similar à da neve. Ocorre em temperaturas
próximas do zero, fazendo a “neve”acumular, na base do salto
A Seguir – Na Reserva da
Cachoeira da Neve, situada em altitude média de 1.200m, encontram-se algumas
das florestas subtropicais de altitude mais bem conservadas que já
observáramos. Seus aspectos paisagísticos podem ser ali esplendidamente bem
observados, assim como sua flora. O pinheiro-do-paraná ou araucária (Araucaria
angustifolia – família Araucariaceae) praticamente não está presente,
dentro dos vales, onde não consegue se propagar, por ser planta que prefere a
luz intensa do alto dos planaltos.
o samambaiaçu-xaxim (Dicksonia sellowiana - família Dycksoniaceae) é um dos elementos mais marcantes dessas florestas e, em determinados trechos, forma populações quase homogêneas, com exemplares de magna altura - até sete metros
Acima
– O chamado Primeiro Salto é a Cachoeira da Neve e seu perfil exibe, de forma
clara, a superposição da espessa camada de basalto, por cima dos velhos
arenitos (rochas sedimentares). Até cerca de meia altura, o visitante pode
contemplar o arenito avermelhado e poroso, enquanto a parte mais alta do salto
é formada pelo basalto escuro e coeso.
Abaixo
– O segundo salto da Cachoeira da Neve está situado poucos metros acima do
primeiro e, na verdade, é formado por outro curso d’água, que se une ao
primeiro, algumas dezenas de metros abaixo. Percebe-se ser ele integralmente
formado no basalto. Acima dele, avistam-se araucárias, que dominam o planalto,
onde são senhores da paisagem
Abaixo - Sapo do gênero Bufo, na escuridão úmida da mata subtropical
Acima
– A orquídea Baptistonia venusta (= Oncidium
trulliferum) era uma das poucas plantas da família em flores, nesta época
do ano
A Seguir – As begônias (Begonia spp. – família Begoniaceae) são
de grande importância florística, dentre as plantas epifíticas da floresta
subtropical de altitude, brindando-nos ora com flores atraentes, ora com folhas
vistosas e coloridas
Abaixo – Linda cortina de
comelináceas (provavelmente uma forma de Tradescantia cf. fluminensis)
pendentes de um galho, que, por sua vez, encontrava-se repleto de bromélias Billbergia
nutans,
que abunda na floresta da Cachoeira da Neve
Acima
– Rochas que jazem sobre o solo, produzidas por velhas rupturas das escarpas,
que produziram os saltos da Cachoeira da Neve, são revestidas de bromélias Billbergia
nutans, planta cujas flores são delicadamente pendentes e prometem
belos espetáculos, durante a fase reprodutiva
Acima – O autor do Blog – Orlando Graeff – examina as imensas
folhas da Gunnera manicata (família Gunneraceae), num dos poucos
exemplares encontrados ao nível do solo. Geralmente, ocorrem encarapitadas nas
frestas da rocha, como na foto a seguir,
na escarpa da Cachoeira da Neve
A Seguir – A Cascata do Avencal é outro admirável
salto, situado poucos quilômetros de Urubici, pela estrada para São Joaquim.
Nas escarpas íngremes, podem ser contempladas intocáveis plantas, como milhares
de bromélias Tillandsia streptocarpa e alguns cactos esféricos do gênero Parodia,
chamados de tunas, que são característicos dos aparados da Serra geral