A floresta valdiviana é
uma das mais intrigantes formações da América do Sul. Seu nome, evidentemente, advém
da região de Valdivia, no sul do
Chile, aonde chegamos, em janeiro de 2008, durante nossa segunda expedição ao
país. Baseados nesta agradável cidade do litoral, partimos para uma ligeira
investigação da natureza desta floresta biodiversa, que ainda recobre algumas
áreas ao norte, onde terminamos visitando o Parque Oncol, que resguarda um
pequeno fragmento quase intacto destas matas.
A floresta valdiviana já cobriu, outrora, extensa parte do
sul do Chile e, em meu livro FITOGEOGRAFIA
DO BRASIL – UMA ATUALIZAÇÃO DE BASES E CONCEITOS (NAU Editora, 2015), referi
um diminuto fragmento relíquia desta floresta, com fisionomia tropicalizada, ao
norte de Valparaíso, em pleno domínio dos desertos, no Parque Fray Jorge. Tanto
lá quanto em Valdivia, a floresta valdiviana se origina evidentemente na forte
umidade litorânea, sendo uma vegetação sempre verde, de forma diversa daquelas
do interior e da zona dos Andes, onde a deciduidade é caráter muito importante.
Tendo conhecido a floresta valdiviana, nesta expedição de
2008, senti-me à vontade para discorrer sobre sua ocorrência disjunta, nas duas
extremidades do Chile, para retratar a influência marítima e das barreiras
orográficas, na determinação de mesoclimas. Os fatores mais importantes para o
surgimento da floresta valdiviana são mesmo essa frentes de umidade e frio, que vêm do Oceano Pacífico, e a longa linha de montanhas costeiras, que
atravessa o país, neste trecho. Chove, nesta região, uma ordem de 3.000mm ao ano,
além das temperaturas relativamente baixas, o que termina por condicionar o
surgimento de uma tipologia que pode ser facilmente caracterizada como floresta
subtropical úmida.
No Brasil, poderemos encontrar paralelos muito próximos, nos
altiplanos do Sul, na zona da Araucarilândia. As florestas que recobrem as
vertentes do Planalto da Serra Geral, escorrendo de sob as araucárias (Araucaria
angustifolia), até altitudes relativamente baixas, nas fraldas dos
Aparados da Serra, são bastante similares à floresta valdiviana. As floras,
contudo, diferem por completo, embora possamos encontrar grupos análogos, lá e
cá.
A floresta valdiviana já se estendeu por quase toda a linha
costeira de Valdivia, tendo sido severamente impactada pelo desenvolvimento.
Hoje, restam poucos fragmentos realmente conservados, sendo o Parque Oncol, que
abarca o Cerro Oncol, em Los Rios, pouco ao norte da cidade de Valdivia, um dos
mais importantes. Vamos às imagens, para que se possa conhecer um pouco da
natureza desta linda vegetação chilena:
Adiante – As belas
praias de Valdivia já foram ornadas pela floresta valdiviana, embora anos de
atividades agrícolas e florestais tenham legado paisagens abertas e residuais.
Porém, a flora característica ainda pode ser observada, ao longo da linha de
costa.
A Seguir – Francoa sonchifolia (Francoaceae) é
uma planta comum, nas bordas de pedras e taludes, acima das praias de Valdivia.
Já se tornou espécie ornamental, mundo afora
Acima – A vegetação campestre, que cerca as praias de
Valdivia, é bastante similar àquela que se encontra na Região Sul do Brasil,
desde Santa Catarina, no perímetro subtropical úmido do país. As apiáceas do
gênero Eryngium, que são os célebres caraguatás, estão presentes, nos
compartimentos mais úmidos, exatamente como nas pradarias do Sul Brasileiro
Abaixo – Praia semideserta
de Valdivia, frequentada por milhares de aves marítimas: paisagens bastante
similares às de Santa Catarina, no Brasil
Lobellia tupa (família
Campanulaceae) é conhecida como “fumo-do-diabo” e vegeta de modo abundante, na
faixa litorânea de Valdivia – Acima.
Detalhe de suas belas flores – Abaixo
Adiante – Próximo
ao Cerro Oncol, a floresta
valdiviana ainda cobre boa parte das encostas, debruçando-se diretamente sobre
o Pacífico azul profundo. São matas bastante alteradas, mas permitem vislumbrar
a flora variada e a fisionomia pujante
Na faixa das marés – A
Seguir – o Oceano Pacífico arrebenta poderosas ondas, sobre rochas que se
alternam entre massas coesas ígneas ou metamórficas e conglomerados ou Stone-lines de detritos exumados pela
tectônica fortemente ativa da região: velhos seixos rolados aparecem, depois de
milênios sob a terra, para servirem de abrigo para aves marinhas, que abundam
no Chile, em função de seu mar piscoso;
Acima – Bromélias
do gênero Fascicularia são local preferido para a nidificação dessas aves
marinhas do Chile
Acima - Fascicularia bicolor é bromélia dominante, nas rochas conglomeradas do litoral de Valdivia
Acima - Fascicularia bicolor é bromélia dominante, nas rochas conglomeradas do litoral de Valdivia
A Seguir –
Aspectos da floresta valdiviana, na região do Parque Oncol, unidade de conservação fundada em 1989, abarcando
montanhas que se elevam até cerca de 700m sobre o mar
Acima – Dentre as numerosas plantas epifíticas da floresta
valdiviana, a gesneriácea Mitraria coccinea se destaca, por
suas flores em forma de ampolas vermelhas.
Acima – O elegante bambuzinho Chusquea culeou abunda, no sub-bosque da floresta valdiviana e remete à fisionomia de nossa florestas de altitude brasileiras, onde o gênero também é importante
Abaixo – A bromélia terrestre Greigia landbeckii é
bastante numerosa, no sub-bosque do Parque Oncol
Acima – Amomyrtus meli é uma mirtácea agigantada, cujo tronco luzidio ressalta bastante, na floresta valdiviana
Acima – Alfombras epifíticas de liquens são características do coração úmido da floresta valdiviana, tirando partido das chuvas contínuas do Sul do Chile
Acima – Podocarpáceas são coníferas que abundam, na floresta valdiviana, confirmando a similaridade entre as florestas subtropicais úmidas do Chile e do Brasil, onde as matas também carregam numerosas árvores de Podocarpus spp.
Nenhum comentário:
Postar um comentário