O segundo e o terceiro dia da viagem foram passados integralmente nas estradas de Goiás e Minas Gerais, em meu caminho, no rumo do Nordeste Semiárido. Uma escala na cidade de Unaí, próximo a Brasília, serviu para dividir em dois dias a distância de cerca de 1.400km que separavam Barra do Garças da histórica cidade garimpeira de Grão Mogol, no Vale do rio Jequitinhonha, onde agora me encontro (de 12 a14/04/2012). Devo registrar que as conexões de internet não são satisfatórias, em grande parte do Norte de Minas Gerais, o que dificulta sobremaneira os recursos de posicionamento geográfico do Google Earth e Google Maps. Assim, ficarei devendo os roteiros desta fase da jornada.
As terras goianas não representavam o foco desta expedição, mas não haveria como deixar de comentar os indícios avistados das vastas florestas estacionais que, um dia, dominaram boa parte do sul daquele estado, estendendo-se até São Paulo, Minas e parte do Mato Grosso do Sul. Os naturalistas que atravessaram o país, no Século XIX, conheceram o famoso Mato Grosso de Goiás, hoje praticamente esfacelado, após longa devastação. Saint-Hilaire foi muito preciso, nos anos de 1820, quando referiu, ao atravessar a região próxima à cidade de Goiás, então conhecida como Villa Boa: “Atravessei novamente a zona das grandes florestas do Mato Grosso de Goiás”. Os derradeiros fragmentos dessas florestas densas ainda podem ser avistados, entre o Vale do Araguaia e as proximidades de Brasília. Junto a Goiânia, por sinal, observa-se uma floresta relativamente bem conservada, no caminho para Brasília.
Esse assunto é muito extenso para ser tratado aqui, neste blog, que tem como objetivo principal narrar minhas viagens pelo Brasil, por ocasião dos preparativos do livro de Fitogeografia, que estamos prometendo concluir, muito logo. Mas, não há como deixar se impressionar com a grandeza sugerida por essas florestas. Infelizmente, não nos foi possível realizar trabalho fotográfico a contento, por conta da exiguidade de tempo para cobrir a longa distância até o Norte de Minas Gerais.
Também impressionaram os largos chapadões, existentes entre Brasília e Unaí, famosa cidade agrícola de Minas. Todos eles são complementares ao planalto oeste baiano e, da mesma forma como se sucedeu no Mato Grosso, encontram-se atualmente cobertos por intermináveis lavouras de grãos. Pouco se poderia dizer, hoje em dia, sobre a vegetação que um dia lhes recobriu. Notáveis e risonhas são as paisagens do amplo vale que abriga Unaí, visivelmente influenciadas pelo calcário, cujos afloramentos ainda podem ser avistados, aqui e ali, abrigando flora característica. Essas paisagens cársticas são singulares e representam monumentos que impressionam os viajantes, até que sejam definitivamente consumidos pela indústria da mineração.
Uma extensa depressão se estende, desde os chapadões de Unaí, até a margem do rio São Francisco. É a região das veredas, que pontuam as diversas áreas mais deprimidas da paisagem. Observa-se claramente que a natureza arenosa dos solos dessa região, que se mostra naturalmente arrasada por passado árido e climas subúmidos subsequentes, foi a responsável pelo surgimento das veredas. Elas diferem daquelas veredas do rio das Mortes e Araguaia: Por lá, elas se associam aos velhos meandros abandonados daqueles cursos d’água, ao passo que aqui, na depressão do São Francisco, elas se mostram concentradas em largas bacias de deposição das areias intensamente erodidas dos solos muito leves. Um cerrado muito singular recobre a região, sujeitando-se a uma exploração um tanto negligente, que mistura pecuária de baixa produtividade com exploração lenheira para s carvoarias mineiras.
A região é muito pouco povoada e as duas margens do rio São Francisco diferem de forma notável: Deste lado, imperam as paisagens de que falei, relacionadas a certo esquecimento pelo agressivo processo de desenvolvimento, que hoje toma conta do Brasil; Na margem direita, no rumo de Montes Claros, percebem-se os indícios da franca explosão econômica do país e muito mais numerosa é a população, sendo essa região marcada por solos mais férteis e produtivos.
A travessia do São Francisco, depois de vencer as áreas desérticas de sua margem esquerda, é sempre emocionante. Já pude atravessar este rio em pelo menos seis locais diferentes, desde suas nascentes, na Serra da Canastra, até o estado da Bahia. Desta vez, foi pela cidade de São Francisco, de onde segui direto à pequena, mas admirável Grão Mogol. Mas, de Grão Mogol, vamos falar na próxima postagem, pois certamente haverá muito a contar.
Acima: Afloramento de calcário, próximo a Unaí, Minas Gerais. Sobre essas paisagens excepcionais, medram vegetações singulares, tanto quanto suas floras.
Abaixo: Vistos de perto, os afloramentos exibem formas curiosas, com sulcos e arestas aguçadas formadas pela lenta dissolução pelas águas das chuvas. Em sua grande parte, vão sendo moídos para produção de calcário, prometendo desaparecerem em algum tempo.
Abaixo: Balsa do rio São Francisco, na altura da cidade de São Francisco, no norte de Minas Gerais.
Acima: Uma andorinha só não faz verão...
Abaixo: ...Pronto! Agora são duas, na cordoalha da balsa sobre o São Francisco.
Acima: A cidade de Grão Mogol, no vale do rio Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais.
Abaixo: Natureza de Grão Mogol.
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