Não se pode afirmar exatamente que a viagem
entre a Serra da Capivara, no sul do Piauí, e a cidade de Belém do Pará seja
curta o suficiente para justificar a surpresa com os contrastes avistados.
Afinal, foram nada menos que 1.200km, em dois dias de volante, entre as duas
localidades. Mas, não haverá como deixar de se surpreender com a imensa
modificação das paisagens, passando da mais seca caatinga, para uma floresta
densa e hiperúmida. Sob o calor do sol, na Serra da Capivara, a sensação é
desgastante, mas não pode se comparar à opressão úmida do ambiente amazônico:
Sudorese intensa; roupas sempre molhadas de suor; e certa dificuldade de manter
razoável nível de atividades.
Na Bahia, havíamos nos deparado com
interfaces climáticas e vegetacionais tão mais abruptas, dando-se em poucos
quilômetros, na altura de Boa Nova e Vitória da Conquista. Mas, por lá,
atravessávamos a grande barreira do Planalto Atlântico, que alterna altitudes
de centenas, até quase um milhar de metros, em algumas dezenas de quilômetros.
Além disso, estávamos na zona das grandes massas frontais de ar, que provêm do
Atlântico Sul. Já entre o Piauí, o Maranhão e o Pará, estados que atravessei,
nestes dois dias de viagem, imperam extensas depressões planálticas, que
produzem relevos mais suavemente inclinados, passando a impressão de que pouco
subimos ou descemos. Mas, não há dúvidas: Operam ali imensos corredores e fronteiras
climáticas, ocasionando notáveis modificações vegetacionais.
Saí de altitudes da ordem de 500m, na Serra
da Capivara, para compartimentos intermediários, por volta dos 200-300m, na
divisa com o Maranhão, onde caíram para até 30-40m. Todas essas interfaces e
naturezas vegetacionais são importantes para o entendimento da Fitogeografia do
Brasil. Por isso, empreendi viagem tão extenuante, sem deixar de ser
imensamente prazerosa. Afinal, nenhuma outra experiência poderia ser mais
agradável ao naturalista que percorrer as terras do país. Sobre essas paisagens
botânicas, que observei, nesta longa jornada, dos dias 24 e 25 de abril, entre
Nordeste e Norte, faço alguns poucos comentários, acompanhados das imagens a
seguir:
Na
foto abaixo: Assim que descemos do planalto da
Serra da Capivara, no rumo norte, percebe-se rápida modificação no aspecto
geral da vegetação. Os elementos arbóreos são muito similares à floresta nanica
do alto da chapada. Porém, percebia-se que se encontrava tão mais atrasada, em
sua queda de folhas, mostrando-se ainda bem viçosa. Árvores das mesmas espécies
da Capivara eram ali mais altas e a vegetação se adensava.
Nas
imagens a seguir: Os célebres carnaubais são
adensamentos da palmeira-carnauba (Copernicia prunifera), que podem ser
vistos, à margem de lagoas e baixadas, em toda interface entre Semiárido
Nordestino e Amazônia.
A
Mata de Cocais: É uma zona com dimensões quase
continentais, estendendo-se entre a Amazônia perúmida e o Nordeste Semiárido e
contando com larguras de até centenas de quilômetros de adensamentos da
palmeira-babaçu (Attalea speciosa). Há quem caracterize a zona dos cocais como
autêntico bioma, o que somente depende da escala de abordagem. Tive bastante
oportunidade de observar sua natureza, relacionando-se com solos, clima e
atividades humanas muito antigas. Infelizmente, encontra-se hoje completamente
dissociada de sua história extrativa tradicional e acaba se vendo encarada mais
como um entrave à pecuária, que um bônus silvestre, que já foi um dia.
Abaixo: Há no Maranhão, adentrando o Piauí, um tipo de vegetação denominada
cerrado, que, nesta área, possui
natureza divergente daquela dos cerrados do Centro-Oeste. Sua flora é principalmente
amazônica e nordestina, sendo condicionado por solos litólicos (com rocha quase
aflorante), opostos aos latossolos profundos do Brasil Central. Olhos pouco
treinados não notarão qualquer diferença.
Nenhum comentário:
Postar um comentário