Reveja outras expedições

UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

REVISITANDO O HABITAT DE UMA BROMÉLIA DO GÊNERO DYCKIA, EM MATO GROSSO – OUTUBRO 2017




Depois de muitos anos, desde a primeira visita ao habitat de uma interessante espécie de bromélia do gênero Dyckia, no Sul do estado de Mato Grosso (ver postagem http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2015/04/encontrando-novas-populacoes-de.html  ), algumas outras indagações haviam surgido, além, é claro, da própria identidade da minúscula e elegante plantinha, que prossegue sem elucidação: que tipo de habitat abrigaria preferencialmente essas espécies-relíquia da flora americana? Por que surgiriam populações segregadas de algumas delas? E por que surgiriam esses endemismos restritos, em meio ao oceano de cerrados, que se estende nessa região do Centro-Oeste?

Nada mais alvissareiro que ter ao meu lado, nesta excursão (que faria parte de uma expedição maior – ver postagens subsequentes, em elaboração), o grande amigo, companheiro de velhas incursões pela região -  Sérgio Basso - que fora, aliás, quem me conduzira ao local, na primeira visita, em 2001). Partimos de Primavera do Leste, onde está centralizado o projeto da Reserva Natural da Fazenda Ipanema, nosso endereço naturalista no Mato Grosso, tendo como objetivo o habitat da minúscula Dyckia sp., em meio aos domínios do chamado Planalto dos Alcantilados, ao longo da rodovia BR070.

O Planalto dos Alcantilados é uma subdivisão geomorfológica, que congrega velhos morros testemunho, deixados para trás pela ciclópica erosão diferencial, que individualizou uma série de mesetas ou tepuis, que são aqueles morrotes de cimeira plana, que se espalham pelo Brasil Central. Ecologicamente, liga duas gigantescas depressões de origem entre o final do Terciário e início do Quaternário: Pantanal Matogrossense e Planície do Araguaia. Nossa investigação não se limitaria ao platô das Dyckias, mas se estenderia a outros morrotes isolados, situados na região, embora já conhecêssemos alguns deles.

Para nosso alívio, a restrita população de Dyckia sp. lá estava, na mesma situação praticamente em que a encontramos, cerca de dezesseis anos atrás: grande quantidade dessas pequenas bromélias esculturais e espinhentas a se espalhar nas bordas de microafloramentos de arenito muito friável; em meio a cascalhos e clastos recém-desprendidos; ou em microdepressões recobertas de areia; dividindo espaço com velosiáceas, orquidáceas, melastomatáceas e farta quantidade de gramíneas, entre nativas e invasoras. Muitas delas haviam florescido recentemente e ainda sustentavam cápsulas repletas de sementes.

Essas plantinhas são realmente muito resistentes, em seu habitat, vegetando agarradas diretamente à rocha sã, ou, quando muito, metendo suas raízes sob pedregulhos calcinados, onde parecem conseguir um pouco de umidade a mais. De todo modo, cozinham sob o sol escaldante do Mato Grosso, resistindo sobre essas velhas cimeiras de rocha avermelhada. Quase inexistem elementos arbóreos no local, o que chama atenção, por diferir de algumas outras Dyckia spp. da região, tal como se observa no habitat de Dyckia rondonopolitana e D. secundifolia (ver postagem - http://expedicaofitogeografica2012.blogspot.com.br/2016/11/visita-ao-habitat-de-bromelias-do.html).

Lá estavam aquelas pequenas plantas ruborizadas, muito decorativas, entremeadas aos demais indivíduos de coloração típica esverdeada, sugerindo estratégia de resistência. O habitat desta Dyckia sp. ocupa claramente um tipo específico de afloramento rochoso de arenito, em que inexistem blocos diaclasados (boulders ou matacões). Embora perigosamente restrito, em face de sua superfície total nada extensa, o afloramento conta com alguns hectares, havendo outros similares, nas cercanias, que não nos foi dado examinar, infelizmente.

Estivemos a examinar outros morros-testemunho, no entorno de até uns cinquenta quilômetros, sem que pudéssemos encontrar quaisquer outras populações dessa plantinha, ou sequer das orquídeas e outras plantas rupícolas ou saxícolas que lhe acompanhavam nesse afloramento. Parece que, a depender da natureza do arenito envolvido no surgimento desses afloramentos, tanto quanto dos processos erosivos que lhes exumaram do coração do solo, esses afloramentos realmente funcionam como ilhas e, como tal, sujeitam-se aos processos biogeográficos que regem sua ecologia.


A região do Planalto dos Alcantilados, assim como algumas de suas circunvizinhas, é abundante em bromélias do gênero Dyckia. Porém, nunca conseguimos encontrar outra população dessa linda plantinha, cuja identidade espero ainda vir conhecer.

Acima - aspecto geral do habitat de Dyckia sp., em Mato Grosso, com inúmeros clastos que descamam da rocha de arenito e as minúsculas bromélias, em meio à macega

Acima - arvoretas surgem apenas em depósitos de solos, em meio a frestas na rocha

Acima - as pequenas bromélias Dyckia sp. ocorrem preferencialmente nas bordas dos afloramentos

Acima - também se aglomeram em pequenas bacias, repletas de areia, vegetando juntamente com Vellozia sp.

Acima - observam-se exemplares de coloração vinácea, lado a lado com outros que carregam a tonalidade tipicamente verde

Acima - recentemente floridas, algumas plantas carregavam cápsulas cheias de sementes

A Seguir - aspecto geral do habitat de Dyckia sp. revisitado


Acima - característico arenito em casco de tartaruga, ao lado do qual ocorrem as Dyckia sp.


Acima - as diminutas bromélias vegetam juntamente com orquídeas Epidendrum campestre

Abaixo - o autor do blog - Orlando Graeff - examina as minúsculas Dyckia sp. do Mato Grosso


Um comentário:

  1. Parabéns, olhos para ver e cérebro para pensar, vontade para agir. Esse é o caldo mais precioso que se pode ter.

    ResponderExcluir