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UMA VISITA À ILHA GRANDE – RIO DE JANEIRO – JUNHO DE 2017

No dia 25 de junho de 2017 , partimos Cledson Barboza , Maurício Verboonen e eu, no rumo da Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro,...

terça-feira, 10 de abril de 2012

PARTINDO DO MATO GROSSO

               Na terça-feira, dia 10 de abril de 2012, iniciou-se minha viagem, partindo da cidade de Primavera do Leste, no estado do Mato Grosso, em direção a Goiás. Estivera, por alguns dias, na Fazenda Ipanema, na margem do rio das Mortes, célebre afluente do Araguaia. Nesta fazenda, venho investigando preciosas reservas de cerrados e florestas-galeria, que foram preservadas do avanço das lavouras de grãos, que praticamente tomaram o território do Centro-Oeste. Na publicação Viagens de Um Naturalista ao Mato Grosso - 1996, hoje hospedada no website Pluridoc.com (http://www.pluridoc.com/Site/FrontOffice/default.aspx?module=Files/FileDescription&ID=5174&state=SH ), o leitor poderá conhecer um pouco mais sobre a Fazenda Ipanema, a partir de excursões realizadas por mim. Também mantenho uma interessante galeria de imagens das plantas da Fazenda Ipanema, no Flickr do Yahoo (http://www.flickr.com/photos/12389332@N08/sets/72157623072166349/).
               Cerca de 350km separam a Fazenda Ipanema, em Primavera do Leste, de Barra do Garças, situada, esta segunda, na margem do rio Araguaia, no ponto exato em que este se vê tributado pelo rio Garças – daí seu nome: Barra do Garças – que é um de seus principais afluentes, na margem esquerda. Não chega a ser uma grande distância, mas o grande interesse que oferecem as paisagens da BR-070 obriga percorrê-la com olhos muito atentos, uma vez que abundam vegetações singulares, todas relacionadas ao Cerrado. Além disso, o planejamento da viagem, que seguirá praticamente direto, até o norte de Minas Gerais, impunha parada técnica, em Barra do Garças, na divisa com o estado de Goiás, desaconselhando seguir adiante, neste mesmo dia.
               Na imagem que apresento adiante, extraída do Google Earth, observa-se grau avançado de alteração da vegetação original, de toda a região, o que apenas acompanha a triste tendência de todo o Centro-Oeste. Contudo, cabe notar duas grandes áreas de vegetação, praticamente intactas, que se referem a reservas indígenas, pertencentes à etnia Xavantes, ou ao menos o que dela restou, nos dias atuais. Embora se saiba, na região, do estado aceleradamente degradado de sua fauna, principalmente, que os Xavantes perseguem impiedosamente, deste há muito tempo, essas duas áreas serviram para conservar extensa superfície das diversas vegetações relacionadas ao Cerrado. Infelizmente, o acesso é vedado a essas áreas e as relações conflitantes dos brancos com os integrantes dessas tribos não convidam à pesquisa interna dessas áreas.
               De todo modo, não deixa de impressionar o viajante a paisagem de aspecto selvagem que se aprecia, ao cruzar essas reservas, ao longo da rodovia BR-070. Um longo corredor de cerrados, nos dois lados da pista, faz lembrar as estradas que conheci, nos anos de 1980, no Mato Grosso. Constitui verdadeira viagem no tempo e permite apreciar, ainda que de forma um tanto superficial, os aspectos fisionômicos e até a composição florística original dessa vegetação, em vias de desaparecimento. Ainda bem que temos as reservas da Fazenda Ipanema, para detalharmos nosso conhecimento sobre a flora do Mato Grosso.
               Ponto de extremo interesse é a localidade de Vila Paredão, que toma emprestado seu nome duma soberba formação geomorfológica, situada entre Primavera do Leste e General Carneiro, no rumo da Barra. Uma autêntica parede, cortada a pino, em antigos sedimentos Cretáceos, se estende, por longo trecho, paralelamente à rodovia. Impressiona o viajante atual, tanto quanto o fazia com os integrantes de caravanas e expedições, dos séculos XVIII e XIX, que seguiam de Villa Boa (atual cidade de Goiás) para Cuiabá, por terra. Dentre as magníficas ilustrações da Flora Brasiliensis, de Von Martius, figura o Paredão de que falamos, cercado de longos renques de buritis que, até os dias atuais, ainda acompanham os córregos, ao seu redor.
               Essas formações são conhecidas por frentes de cuestas e marcam o relevo de quase todo o perímetro subúmido brasileiro. Representam heranças de períodos áridos, nos quais imperavam estupendas forças erosivas, que geravam os pediplanos e peneplanícies do Brasil Central. Neste Paredão (também referido popularmente como Paredão Grande), observa-se recente avanço da dissecação abrupta do relevo, através de gigantesco desmoronamento de fatia de arenito. As camadas sedimentares superiores, mais jovens, se vão ficando penduradas, numa cota aproximada de 740m, onde ainda são identificadas velhas superfícies de cimeira da região. Na estrada, onde se margeia o imenso monumento natural, a altitude é da ordem de 600m.
               Barra do Garças também se encontra situada aos pés de serranias semelhantes: é a Serra Azul, que nada mais é do que uma disjunção local da lendária Serra do Roncador, na qual teria desparecido o famoso coronel Fawcett, que seguia velhas histórias de riquezas escondidas, nos sertões mato-grossenses. Atualmente, são os discos voadores e extraterrestres que povoam os mitos regionais e a Serra Azul possui até mesmo um discoporto, que virou atração turística local. Não obstante seus mitos, Barra do Garças possui geografia atraente, com cascatas e praias do rio Araguaia, que ficam lotadas, durante a estação seca, especialmente em julho.
               Daí para frente, no sentido nordeste, aproximadamente, estende-se a depressão do Araguaia, que domina grande parte de Goiás e Tocantins. Ab`Sáber atribuía similaridades geológicas-geomorfológicas às depressões do Araguaia e do Pantanal, cuja história teria sido marcada por intensa subsidência (afundamento) e entulhamento com sedimentos dos dois últimos milhões de anos – Quaternário. Meu rumo me levará para fora da depressão do Araguaia, pois seguirei na direção de Brasília, buscando a zona das grandes veredas, entre Goiás e Minas Gerais. Mas, isso ficará para as próximas postagens, sabe-se lá quando as conseguirei efetuar. Por ora, dou adeus ao Mato Grosso e começo a me preparar para minha travessia pelo Semiárido do Nordeste, que atravessa, momentaneamente, sua mais pronunciada seca, nos últimos trinta anos. Até lá. 


Acima: Roteiro da primeira fase da expedição, sobre imagem Google Earth
Abaixo: Mapa Google Maps da região sudeste do Mato Grosso



Acima: Aspecto de uma floresta estacional da Fazenda Ipanema, em Primavera do Leste


Acima: Vista parcial de uma das veredas da Fazenda Ipanema, que tem servido para a investigação de sua fitogeografia
Abaixo: Capivara, na margem do rio das Mortes, na Fazenda Ipanema



Acima: Dois pássaros disputam território, numa lagoa marginal do rio das Mortes
Abaixo: Borboleta dos campos alagáveis do rio das Mortes



Acima: Trepadeira da família Bignoniaceae, no cerrado da Fazenda Ipanema


Acima: A rodovia BR070 atravessa um dos trechos de reservas indígenas, entre Primavera do Leste e Barra do Garças: Vista hoje incomum de longo trecho de cerrados preservados
Abaixo: O Paredão Grande, que um dia impressionou os viajantes, que cruzavam o sertão, entre Villa Boa e Cuiabá


Abaixo: Imagem-satélite Google Earth da área do Paredão Grande, na Rodovia BR070


Abaixo: Desmoronamento recente de parte do Paredão: Evolução dos relevos de cuestas do Centro-Oeste



Acima: Vista da cidade de Barra do Garças, tomada do alto da Serra Azul, vendo-se o encontro dos rios Garças (direita) e Araguaia
Abaixo: Um periquito-maracanã se prepara para o “café-da-manhã”, na margem do rio Araguaia


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